27 novembro 2005

VOU VIAJAR

27 novembro 2005 2
Levi Nauter
Estou quase indo viajar. Não farei uma viagem dessas comuns. Vou sair de um lugar e ir para outro. A rotina me incomoda, esse negócio de ficar sempre no mesmo lugar não dá certo. Sem contar que eu não gosto de apenas discursar e não cumprir. O mundo já está cheio de gente assim - que diz e não faz - não precisa de mais um. Ser educador exige que gostemos de preservar as palavras - tanto no sentido da boniteza quanto no cumprir com ela.
Por isso vou espairecer. Quero ver outros lugares, outras pessoas, sonhar outros sonhos. Quero (re)organizar minha vida, planejar de novo. Quero pegar outro ônibus. Quero contribuir mais efetivamente. Poder discutir tete a tete, ser escutado ou bronqueado quando fizer jus. Quero ter algum dia de folga - porque acho bom para viver. Só trabalhar 24 horas por dia não nos deixa viver. Ao contrário, nos faz envelhecer mais depressa, nos tornamos mais chatos. Quero não fazer nada, me espreguiçar, bocejar, ouvir música, ler, escrever. Chutar o balde, a pedra. Dormir, dormir muito. Comer, beber.
Aos trinta e um anos, acho que já posso começar decidir o que quero.
2006, aguarde-me !!!

23 novembro 2005

Poesia # FINAL DE SEMANA

23 novembro 2005 1
Levi Nauter

Hoje despi-me de tudo
tirei a roupa burocrática
desvesti minha voz do politiquêz
e do politicamente correto

Fiquei pelado
optei por dizer palavrão
esqueci de falar pausadamente
quis correr, após passar o dia num balcão

Encontrei uma mulher
abracei-a, alisei-a
deixei correr meus dedos em alguns lugares
juntos
fomos à praia

Lá, dormimos
pisamos na areia
fizemos amor
o sono veio
a rede
eu
ela
nós
zzzzzzzzzz...

18 novembro 2005

CHUTEI A PEDRA E TIREI A UNHA ENCRAVADA

18 novembro 2005 0
Levi Nauter
Cresci sob um teto sossegado,
meu sonho era um pequenino sonho meu.
Na ciência dos cuidados fui treinado.
Agora, entre meu ser e o ser alheio
a linha de fronteira se rompeu.
Waly Salomão [in Algaravias, Editora 34, p. 21]
Já não aguentava mais. Caminhava, caminhava e desgraçadamente enxergava aquela maldita pedra no meio do caminho. Acho que nunca vou esquecê-la. Mas hoje tomei uma atitude. Puta merda, chutei a pedra. No início doeu o dedão do pé. Foi bom, descobri uma unha encravada. Deixei-a de molho n'água por alguns minutos e, pimba, foi-se.
Agora estou tendo tempo - uma vez que a pedra não atrapalhou mais meu caminho e, portanto, pude chegar em casa - de rir com as piadas contadas no Planalto. Incrivelmente Deputados, que ganham bem para bem intervirem nas questões legais, não sabiam dos prazos de início e/ou término de seus trabalhos nas comissões 'para lamentar'. Contudo, temos ainda de lutar para o fortalecimento da democracia e, nesse ínterim, deslizes irão ocorrer. Ao mesmo tempo teremos de sugerir ao Congresso Nacional que comece a visitar livrarias (essas megastores da vida) na busca de bons livros existentes no mercado que tratam dA importância do ato de ler.
Acho que esse povo começa a ser minha nova pedra. Já sem a unha encravada por não estarem exatamente no meu caminho, o que poderia eu fazer?

05 novembro 2005

O EXEMPLO DRUMMOND

05 novembro 2005 1
Levi Nauter

Tanto Drummond como seus companheiros do Modernismo nos dão uma lição: temos de ousar fazer coisas diferentes. Por minha vez, estou peleando contra as frustrações da vida. Por vezes penso que pouco há o que fazer; noutras, acho que tenho de continuar tentando. Enfim, fico com as duas opções: nalguns momentos fico triste, em outros busco a felicidade. Não é muito fácil. Talvez essa seja a razão de a felicidade ser uma constante e incansável busca.
Ainda assim, o exemplo Drummond me vem a mente ao lembrar que todos queriam divagar sobre assuntos politicamente corretos. De repente:
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
No meio do meu caminho ainda tem uma pedra. Penso que, como esse autor, nunca esquecerei esse acontecimento. Pois, no meio do meu caminho ainda tem uma pedra. Lá está ela. Não sei se chuto, não sei se passo ao largo.
Mas estou vendo-a,
no meio do caminho.

20 outubro 2005

ESTOU VENDO A MORTE

20 outubro 2005 5
Levi Nauter
"Em seu féretro com panejamentos de púrpura,
separada da realidade por oito torniquetes de cobre,
a Mamãe Grande estava então por demais embebida
e sua eternidade de formol para perceber
a magnitude de suagrandeza."
(García Marquez, in Os funerais da mamãe grande)
Não gostaria de ter que admitir. Mas ela está rondando meus entes queridos. Minha mãe está morrendo. Já não posso mais negar, queria que tudo não passasse de uma ilusão, gostaria de ver minha mãe gorda e saudável, forte e convincente, lúcida e guerreira. Ao contrário, vejo-a como uma caveira, não porque quero, é que assim ela está. Seu olhar é fundo, quando a abraço sinto os ossos escondidos por uma pele escura e judiada – pele recheada de hematomas, cicatrizes (aproximadamente quatro cirurgias de hérnias), feridas que insistem em contaminar em função de uma diabete quase implacável. São algumas pistas da morte que vem chegando. Agora, sob controle, lá estão os sinais das tais feridas que tanto foram coçadas.
Olho para ela e sinto-a como que querendo abraçar a dita cuja. Como se dissesse “venha, estou pronta para dormir o sono das sombras”. Há nela um olhar de morte, de desespero, de “me tirem desse mundo”. Ar de sofrimento que se esgota, de quem já apanhou que chega da vida mesclado por uns tapas do marido (aquele para quem ela se entregou, foi fiel, deu). Ar de quem, nalguns momentos, defendeu-me de apanhar nas vezes em que fiz ‘arte’, nas vezes em que tentei ser gente e meu pai não entendeu. O fio de luz com o qual eu apanhava parou, fortemente seguro pelas mãos da mãe. A mesma mão que fazia faxina para complementar a renda familiar. Também a mesma que ousou trazer gibi para os filhos lerem algo que não fosse a Bíblia. Igualmente a que trouxe uma televisão quando um desgraçado evangelho pregava a teologia do medo.
Sua voz anda embargada, sem forças. Não tem a mesma impetuosidade de outrora, quando gritava “vem pra dentro ou entrego vocês pro pai” ou ao dizer “é um diabo esse guri”. Ainda a mesma que amedrontava ao dizer “não vai te passar com as tuas irmãs”. Ah, voz. A idêntica que noutros tons deve ter sussurrado com meu pai e, puxa, a sinônima que o mandou-o embora ao saber que fora traída. Finalmente, a mesmíssima que foi abafada na tentativa de esconder choros devido aos sofrimentos psicológicos.
Pernas fracas. Elas estão entregues às traças, já não têm a mesma firmeza das vezes em que caiu comigo no colo sem que eu alcançasse o chão. E que colo bom era... Lembro-me dele quando nossa casa destelhou. O colo, o cobertor, um saco plástico e as rezas nos salvaram.
.......

23 setembro 2005

O QUE FAZER?

23 setembro 2005 0
"Escrevemos para denunciar o que dói".
Eduardo Galeano
O que nos resta fazer como educadores que prentendemos ser? Como pedir e tentar ensinar aos alunos a importância do respeito ao outro, o direito de o outro dizer o que pensa - ainda que discordemos? Como ensinamos democracia num país em que ela parece ser comprada? Como dizer "aluno, não é legal brigar" quando um deputado quase fura o outro? Ultimamente tenho ficado com vergonha desse parlamento. É claro que entendo a democracia como sendo um processo e que nele estamos longe. Contudo, imagino que nossos reperesentantes, sob nenhuma hipótese, deveriam assim se comportar. Tenho feito um esforço sobremaneira para continuar tendo esperança. Mas está difícil.

16 setembro 2005

A COISA MAIS LINDA DO MUNDO

16 setembro 2005 0
A coisa mais linda do mundo foi ter Roberto Jeferson na Câmara.
Era o único momento em que aquele lugar ficava cheio.
Eles estão certos: nós somos legais, pagamos bem aquele povo. Eles fazem um monte de coisas por nós, tipo nos desarmar. Além do mais, alguns senhores só saem de lá para se aposentar. Aqueles ínfimos 21.000,00 são suas únicas formas de ganha-pão. Coitadinhos.
Agora com a saída do Je, quem vai encantar? Quem fará aquela casa encher?

14 setembro 2005

MEUS GRILOS

14 setembro 2005 0
Levi Nauter

Minha casa é de madeira. Tem dias que ouço o belo barulho dos grilos – prefiro dizer que eles cantam. O problema é não agüentá-lo mais, após aproximadamente vinte minutos. O que era bom passa a ser ruim. Antes um som da natureza criada por Deus, de repente, um ensurdecedor ‘demoninho’ devido o barulho que faz.
Comecei a pensar no meu cotidiano. Sou cheio de grilos, de problemas interiores. Nalguns momentos acho isso legal pois cresço, supero-me, pareço imbatível. Se me descuido sou insuspeito, ando como quem não tem problemas, eretamente, olho pouco para os lados. Noutras ocasiões sinto-me derrotado, não avanço, milhões de coisas passam pela minha cabeça. Parece haver literalmente um grilo na minha mente. Tomo cafezinho, ligo o som (para ouvir alguma música ou alguma voz), olho televisão, rezo em pensamento – quando não de joelhos mesmo. Penso nas famigeradas frases de efeito algum, como “quem mexeu no meu queijo”
[1], “não faça tempestade em copo d’água”[2]. Choro, tento rir. Respiro fundo, confiro os batimentos cardíacos, torço para a hora passar. Suo, tomo água. Quando indagado sigo meu clichê: ‘tudo bem! E com você?’
Mas sabem o que é pior? O grilo não vai embora. Um dia bati na parede de casa devido a zoeira do bichinho. De nada adiantou, trinta segundos depois lá estava o cricrilar. Minha vida é assim e acho que não sou o único: meus grilos vêm e vão, um dia estou bem, no outro mais ou menos, em seguida, mal.
Por isso é que certas pessoas são importantes. Elas nos mostram o grilinho que o vemos como grilão. Dão-nos pistas para melhorias, perguntam para podermos responder muito mais a nós do que para elas. Existem outros que parecem ter o dom de apenas olhar, apenas fazer um gesto. Nada falam, mas tudo dizem. Ainda existem os duros na queda. São os que nunca estão satisfeitos, os desafiadores, os lançadores dos terríveis ‘por que isso, por que aquilo?’. Os mesmos que alfinetam ‘tá bom mas poderia ter ficado melhor’. Toda essa gente pode ser chata em algum momento, os grilos também o são. Acho que a vida seria sem graça com a ausência desse pessoal; os ‘moles’ me fazem ver que não sou tão ruim quanto pareço às vezes, os ‘durões’ me desafiam para o presente hoje e para o futuro. Ambos mostram minha gentetude
[3], mostram-me que só erro por ser humano, sou humano graças a eles.
Descobri, com um misto de alegria e tristeza, uma coisa: sou cricri.

NOTAS:


[1] Obra do Dr. Spencer Johnson da qual surgiu outras bem ao estilo made in USA. Ex.: “Quem mexeu no meu queijo?” para Jovens. Ah, a publicação é da Record.
[2] Segue a mesma linha do item 2. Obra de Richard Carlson, publicação da editora Rocco, o livro ganhou versões como Não faça tempestade em copo d’água (no amor), Não faça tempestade em copo d’água (no trabalho), Não faça tempestade em copo d’água (com a família), Não faça tempestade em copo d’água (para adolescentes), Não faça tempestade em copo d’água (para homens), Não faça tempestade em copo d’água (para mulheres). Viu como cansar.
[3] Expressão cunhada pelo quase imortal Paulo Freire.

09 setembro 2005

Brasil I love you

09 setembro 2005 0
Levi Nauter, 09-09-05
Eu amo o Brasil. Isso precisa ficar claro antes de alguns esquerdas considerarem que sou falso ou coisa que o valha. É exatamente por amar que não estou contente com ele. Se não amasse seria indiferente quanto aos acontecimentos atuais. Essa vergonha nacional - que não começou e tampouco terminará agora - exige que busquemos informações, leiamos jornais, revistas, assistamos televisão e troquemos impressões com outras pessoas. Também não pode ficar de fora uma busca bibliográfica da história, até para ratificarmos o reflexo de outros tempos no de agora.
Na minha vida particular, posso dizer que amo a Lu. Mas também tenho de confessar que, às vezes, nos estranhamos. E no amplo sentido da palavra. Por vezes não a conheço nem ela a mim. Então levamos algumas horas, quando não dias, para retomarmos o diálogo, (re)estabelecer a fraternidade, o bate-papo descontraído. Parece que, nos primeiros instantes, um de nós fica meio desconfiado, olha meio de soslaio. Mas, de repente, tudo fica bem, as coisas voltam ao normal e, suponho que pelo amor que nos sentimos, vamos esquecendo d'outrora e tocamnos o barco. Contudo, até chegar aí reivindicamos, protestamos, ficamos 'de bico', entre outras demonstrações. De uma coisa continuo tendo certeza: continuo amando em que pese minha discordância. Marisa Monte dá o clima (Amor I love you/Amor I love you/Amor I love you/Amor I love you).
Com o Brasil é a mesma coisa. Continuo amando-o. Todavia não posso aceitar essa coisa que anda acontecendo. Muitos trabalhadores sem aumento há um bom tempo, enquanto alguns assessores de deputado com a sorte de ter bons rendimentos. Nosso Presidente não fala efetivamente da crise, e, quando o faz, resvala em contradições quase imperdoáveis. Tenho a impressão de que temos, governando o país, o melhor que poderíamos ter. Ainda prefiro esse pensamento que engatinha para o social a ver governos sem o mínimo de preocupação com isso. O presidente da Câmara é uma calamidade, acho até que tem de sair. Mas quem irá assumir? Vai mudar radicalmente alguma coisa? Sinceramente penso que não.
Por amar esse país, acho que o Presidente deveria dar uma explicação mais convincente da situação. Por esse mesmo amor tento renovar minhas esperanças na tentativa de tirar o medo que ainda me ronda buscando tragar minha confiança na classe político-partidária brasileira. Só algumas questões ainda não entram na minha cabeça. Ser patriota não é exatamente andar com uma bandeira do Brasil a tiracolo. Meu amor ainda não é ágape, ainda não morreria pelo país. Meu amor parece ser platônico: vislumbro que nalgum dia sejamos livres, independentes - inclusive da grande mídia, ou seja, conseguindo ler, ver e ouvir de tudo sob o crivo da criticidade aliado à raivosidade sadia pois esta não me deixará passivo.

16 agosto 2005

CORTEI OS BRAÇOS

16 agosto 2005 0
Levi Nauter, em 16-08-05
Mais do que nunca a matraca (que tratei no texto "A matraca nossa de cada dia" - ver ícones) tem funcionado. Também nada mais atual que as grandes composições de Chico Buarque. A história tem andado em círculos. A matraca tem corrido solta a dizer que de A a Z ninguém é inocente. Chico continua dizendo "que a coisa aqui tá preta".
Eu decidi "cortar os braços". Não quero ser de direita nem de esquerda. Já achava esse papo um tanto ultrapassado. Agora, acho vergonhoso. Não me interessa o lado. Quero pensar no social, no humano; mas também no conforto de uma bela casa, olhando e curtindo um DVD; na encomenda de livros pela internet. Chega de achar que a tecnologia é retrógrada ou elite. Todos têm de ter acesso a ela. Claro que continuarei apreciando uma boa horta, colher a fruta do pé; não achar que a agricultura familiar salvará o mundo, em que pese ser importante.Também vou querer que todos tenham direito à terra, à iclusão digital, à educação de qualidade, ao emprego com um salário digno (e não precisa ser de R$ 21.000,00 como o de alguns privilegiados) porque sei poupar.
Vou continuar lendo e me emocionando com Paulo Freire. Como ele, vou querer, com toda minha força, preservar e fortalecer as instituições democráticas. Lerei mais de uma vez o Manual do perfeito idiota latino-americano (editora Bertrand Brasil), bem como todas as obras que me parecem úteis. Em todas quero continuar exercendo minha criticidade, minha dúvida impulsionadora da pesquisa e geradora do saber que, com o tempo, torna-se em conhecimento.
Continuarei achando abominável aqueles que dizem uma coisa e fazem outra. Ainda considerarei absurda a atitude dos que têm um discurso democrático e uma prática repressora. Ou dos que ainda interrogam: "você sabe com quem está falando?". Ou daqueles que se sentem no direito de tudo por estarem numa posição momentânea de poder.
Mesmo contra a maioria, discordarei de que "a voz do povo é a voz de Deus" - embora refletirei na importância de ouvi-la. Mas quero um mundo mais justo, mais humano, mais coerente, mais dialético e menos, muito menos, corrupto.
Minha vida vai continuar. Os projetos que tenho não vão parar só porque alguns grandes andam mais pra lá do que pra cá. Ainda vou ouvir muita música de qualidade, essencialmente a brasileira e a instrumental. Também vou ler Garcia Márquez ( Memórias de minhas putas tristes promete...), Saramago, Cony, Galeano, entre outros. Quero desprender-me desse sistema. Aliás, "o sistema esvazia nossa memória, ou enche a nossa memória de lixo", disse Galeano.
Se tudo isso é se de esquerda, sou esquerda. Se de direita, que seja. Cortei meus braços. Agora só possuo a mente e as pernas. Agora vejo, penso e decido o lado para o qual vou andar. Não tenho mais como me agarrar seja em qual lado for. Estou acostumando a desapegar-me.

22 julho 2005

SE O PAULO ESTIVESSE VIVO

22 julho 2005 0
Levi Nauter


"Nossa preocupação deve ser com melhorar a democracia, e não apedrejá-la, suprimi-la, como se ela fosse a razão de ser da falta de vergonha que aí está. (...)...o que devemos fazer é aperfeiçoar as instituições, diminuindo as facilidades que ajudam as práticas antiéticas." (Paulo Freire in Cartas a Cristina, p. 20)


As palavras do grande educador ainda continuam ressonando pelos livros e pelos corredores das academias. É fácil notarmos que lê e diz aos quatro cantos "eu adoro Paulo Freire". Mas poucos têm a práxis freireana. Paulo ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores. Como ele reagiria frente ao que estamos assistindo? As nulidades, como diria Rui Barbosa, estão crescendo assustadoramente. O silêncio de alguns é crítico, o de outros não acontece - infelizmente - por sentir-se político.
Estamos assistindo a um jogo frenético de poder; a trocas meramente político-partidárias, à barganhas por, sim, 'más companhias'.
Contudo há que se ter esperanças, temos de tirá-la do garrão. Temos de reconstruir, refazer nossas ideologias políticas. Inevitavelmente somos políticos, por isso não resta outra alternativa a não ser a morte - caso não aceitemos a renovação da esperança.
Cá comigo, ando atrás dessa dita cuja. Por vezes expulsamos quem não deve enquanto deixamos de lado aqueles que realmente deveriam fazer as malas. Mas a vida é assim mesmo (por vezes caímos nessa...). Resta-nos seguir em frente, torcendo para que os 'maiores' comecem ouvir os supostamente menores.

16 julho 2005

COMO ANDA O BRASIL

16 julho 2005 0
Estou como andam as coisas no Brasil: feias.
Estou como as pessoas estão em relação a tudo o que está acontecendo: caladas.

Estou sentindo o que muita gente anda sentindo: vergonha.

Às vezes ao ser muito justo acaba-se por tropeçar na própria justiça.

Estou preferindo não falar, tal é minha indignação.
Chega de demasia.
Chega de tentar ser o arauto da justiça.
Chega de se achar o 'puro'....
chega...

21 junho 2005

PERGUNTA AO DIRCEU

21 junho 2005 0
Um cidadão comum dificilmente é atendido por alguém com uma reputação bem poposuda (como diaria Edu K). Não sei se algum dia conseguirei conversar com José Dirceu, agora ex-ministro da Casa Civil. Mas se conversasse diria que fez a melhor escolha. Há momentos em que nossa melhor escolha é desistir. É parar. É dizer "vou continuar pensando o que até aqui pensei, porém noutro ângulo, sob outros holofotes".
Melhores ainda são as perguntas do nosso célebre Drummond. Aliás, nosso cotidiano tem ressucitado uns quantos mestres da nossa língua. Mas, leiamos o que o Carlos perguntaria:

e agora, José?
a festa acabou,
a luz apagou
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
(...)
está sem carinho,
está sem discurso,
(...)
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia,
e tudo acabou,
e tudo fugiu,
e tudo mofou,
e agora, José?
e agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
(...)
sua biblioteca,
(...)
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
com a chave na mão,
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
(in Andrade, Carlos Drummond. Seleta em Prosa e Verso. 12 ed. Rio de Janeiro: Record, 1994.)
Preciso dizer alguma coisa?

17 junho 2005

ESCLARECIMENTO: não consigo ser alegre o tempo inteiro

17 junho 2005 0
Levi Nauter, em 17-06-05.

Resolvi deixar algumas coisas claras. Aquele papo tipo 'vamos conversar sobre a relação' bateu-me. Andei ouvindo que sou depressivo, que graças a Deus não tenho arma (nem poderia, a campanha do desarmamento e a minha opção político-social não permitiria). Opiniático, diria Machado de Assis, e assim me sinto. Não acho a vida cor-de-rosa, não a considero fácil. Também sofro com as desigualdades, acho um saco o que a grande mídia propõe-nos apenas porque vende ou dá IBOPE. Não suporto a superficialidade de muita gente, a vida de plástico, a prostituição social, o enriquecimento ilícito de muitos PPs (políticos, pastores e, sim, padres). Tenho ojeriza aos que não sabem ou fazem-de-conta que não sabem dos seus papéis, direitos e deveres; dos que tomam favores como se fossem direitos adquiridos; dos que misturam as coisas - dos que separam as coisas. O que tenho feito até agora é dizer, é trazer à luz, tornar claro. Possivelmente não para os outros mas para mim mesmo. É escrevendo que busco ordenar meu caos. assim é que me permito (re)ordenar, assim faço-desfaço-refaço-me. Este é o processo pelo qual 'saio de mim' de vejo 'de fora', à distância, e, parece, vou conseguindo me estabilizar.
Penso que a vida não está melhor nem pior que antes. Está como sempre esteve, a diferença é que hoje os holofotes são mais agressivos. Hoje temos um maior número de informações ao nosso alcance - algumas, descartáveis, sem profundidade, é verdade. Não me choco tanto com as coisas, talvez aí meu defeito. Espero e imagino que a natureza adâmica é, na essência, má, egoísta e mortífera. Morte, traição, dissimulação, intransigência e a lacônica pulsão de morte estarão nas entrelinhas das relações interpessoais - muitas vezes travestida de elegância. Afinal, quem sairia alardeando que odeia o seu companheiro por ser mais inteligente, ou por ganhar mais e fazer menos, por exemplo?
Também somos sensuais, outra característica humano-adâmica. Adoramos ser bem vistos. Amamos causar suspiros. Nosso ego é afagado ante o elogio. O coração dispara quando os olhos, teimosamente, insistem em cruzar por uma bela bunda, um conservado par de seio, uma coxa masculina, uma bunda de macho. Puta...
Ah, ainda enrubescemos com essas coisas. É bom pensar em sexo. Ler sobre nos deixa tímidos. Nos chocamos frente a palavrões como caralho, fudeu (já nem tanto), filho da puta, entre outros. Não deveríamos ser assim. Qual a diferença entre dizer o palavrão e ler o palavrão? Que tal sermos menos hipócritas?
Em meio a distração, de uma martela no dedo. Mas não deixe de ligar um gravador. Tenha uma câmera escondida e veja sua reação quando alguém tropeça na sua frente.
Pra finalizar, deixo claro que adoro escrever, ler bons livros, ouvir uma boa música brasileira (exceto o pagode e as 'pseudossertanejas'). As internacionais não ficam de fora. Aprecio chimarrão, um bom bate-papo. Sobretudo, amo ficar com minha mulher. Tem coisa melhor que comer, beber, dormir... e não pagar?
Só tem um problema: eu não consigo ser alegre o tempo inteiro.
PS: Vander Wildner é muito bom pra se ouvir passeando no brique da redenção.

12 junho 2005

Clarice Lispector e Xico Xavier

12 junho 2005 0
Levi Nauter, em 12/06/05.


Devo começar dizendo que não sou espírita. Não acredito nem um pouco nessa coisa de psicografar pelo espírito de alguém. Será que tal espírito não teria, no além, coisa mais importante para fazer que tivesse que descer a esse mundo literalmente decaído e ficar mandando mensagenzinhas? E o pior, mensagem por livro. Se o espírito fosse assim tão esperto saberia que pouca gente lê. Viesse, então, pela televisão, pela novela. Boa, que viesse pelo espírito de 'A Lua me Disse'.

Espíritas e espíritos à parte, fiquei pensando por que escrevo. Não é por psicografia, portanto. Então é por quê?
Relendo Clarice Lispector descobri uma frase primorosa: "Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever." (in A Hora da Estrela). Que maravilha!

Acho que nunca encontrarei respostas pra tudo, assim, como podem ver, continuarei escrevendo. Pelo menos enquanto pelo menos uma pessoa me ler. Sei que não é tarefa fácil, a mesma Clarice diz que é "como quebrar pedras" e tenho tentado fazer isso. Fico sem escrever, às vezes, como forma de protesto. Dizem que o calado vence. Até agora não tenho vencido.

Atualmente não temos visto muitas respostas. Quando parece que elas vão surgir, algum partido tenta barrá-las. Partidos que dantes eram precursores da famigerada CPI agora andam correndo léguas, tentando passar de largo. Continuamos sem respostas...
Então me resta escrever.
Pra ti, pra mim mesmo.
Assim faço a terapia
Assim lavo a alma
Assim me carrego
Assim desestresso
Assim gozo
Assim...
Assim.

05 junho 2005

AINDA SEM PALAVRAS

05 junho 2005 0
É minha gente.
Continuo sem tempo para escrever. A vida também é assim. Os professores acham que a gente não tem nada pra fazer, porque dão trabalho a torto e a direito. Cada um quer que seja lido a sua proposta.

Estou nessa. Dois trabalho para essa semana. E o tempo...
Tchau

21 maio 2005

QUEM NÓIS É ?

21 maio 2005 0
Levi Nauter, em 21-05-05

Ainda espero ver as pessoas mais sinceras. Aqueles tipos que dizem o que pensam, que optam por alguns minutos de cara feia a uma vida de fachada. Gente pronta a trocar vivencias.
Infelizmente, como dizia T.S. Eliot, algumas tecnologias nos dão a sensação de intimidade, de conhecermos celebridades há anos. Mal percebemos que nos distanciamos cada vez mais; ou seja, ocorre exatamente o contrário do que pensamos. Futilidades estampam capas de revistas. Fatos e fotos (parece nome de revista) buscam aguçar nossa curiosidade na busca do nada. Somos calvos, temos barriga, estrias, chulé, dor de cabeça, unha encravada. Vomitamos, peidamos.
Somos gente, esse animal dito racional.
Nossas mazelas estão começando a cheirar mal. Talvez por isso usamos Natura, Avon, Axé, Alma de Flores. Por isso queremos West Coast, Wrangler, Ferracini, Berimbau, Blue Steel. No almoço queremos Coca-Cola, Pepsi, Bud. Adoramos comida japonesa, italiana, alemã. Onde está a brasileira?
Queremos ver fulano, cicrano e beltrano tomando umas e outras, pois é quando se põe os podres pra fora. O tesão é podermos rir do outro. Legal ver uma velha tropeçar. Às novas emprestamos as vazões de fantasia. Falamos mal de todo mundo. Mas abraçamos, dizemos “ou querido(a)”. Trabalhamos juntos porque não há alternativa. Se houvesse, ainda trabalharíamos juntos pois faz bem ao ‘social’, não admitimos ser egoístas. Nós? Capaz...
Pois continuamos sós. Nossas amizades continuam limitadas ao nosso mundo. Mundo de plástico: tem de estar numa boa temperatura; se o clima esquentar derrete, muda a forma torna-se, talvez, nada. Podamos, ignoramos, desdenhamos, fazemos de conta que não vemos nem ouvimos. Contudo, no fundo, falamos muito (mesmo que conosco mesmos).
Que vida é essa?
Em que mundo vivemos?
Que importância há numa vida de plástico?
“Quem somos nós, quem é cada um de nós
senão uma combinatória de experiências
de informações, de leituras
de imaginações?”
Ítalo Calvino
In Seis propostas para o próximo milênio,
São Paulo: Cia. das Letras, 1995.

12 maio 2005

A MATRACA NOSSA DE CADA DIA

12 maio 2005 1
Levi Nauter, 12-05-05
Nestes dias tenho pensado sobre um assunto, graças ao nosso célebre e imortal Machado de Assis (este realmente merece o título, não só porque foi um dos mentores da Academia Brasileira de Letras). Trata-se da arte de fazer outros crerem nalgo mesmo que não seja verdade ou que seja meia verdade. Em tempos nos quais muita gente quer dar discursos, melhorar a todo custo a própria imagem a fim de diversos fins, vamos deixar o Machado explicar no que consistia a matraca dO Alienista - conto que todo brasileiro deveria ler.
"Contratava-se um homem, por um ou mais dias para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mão. De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam - um remédio para sezões, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesiástico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano, etc. o sistema tinha incovenientes para a paz pública; mas era conservado pela grande energia de divulgação que possuia. Por exemplo, um dos vereadores (...) desfrutava a reputação de perfeito educador de cobras e macacos, e aliás nunca domesticara um só desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crônicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavéis dançando no peito do vereador; afirmação perfeitamente falsa, mas só devida à absoluta confiança no sistema." ( in Papéia avulsos, RJ, SP e RS: Ed. V.M.Jackson Inc.)
É interessante notar que tudo não passava de uma representação. Dito de outra maneira, alguém com vocação ou designado para a função de matraqueiro, saía às ruas dizendo o objeto de ganha-pão. De tanto ouvir as pessoas acabavam acreditando. provavelmente o contraponto era nulo. E o certo é que funcionava.
Com certa tristesa tenho de admitir a facilidade de encontrarmos matraqueiros contemporâneos. Falam, falam, nada dizem (aliás, Tom Jobim, em Samba de uma nota só, já ratificava).Contudo, podemos pensar que esses falantes ganham bem para fazerem o papel de eco.
A política lembra-nos essa espécie de 'pão nosso de cada dia': cede-se aqui, ganha-se ali, esquece-se dos valores adquiridos adiante. E por aí vai...
Democracia não existe. Os que hoje mandam, em qualquer instância, pressupõem ter a autoridade e nós, subalternos, fingimos que obedecemos (e às vezes nem isso conseguimos). Quando obedecemos o fazemos por conveniência. Há momentos em que é melhor sermos ator. A liberdade parece não existir também. O que talvez tenhamos é a autonomia - conquistada por um árduo preço cotidiano. "Somos um bando, um bando, um bando e muitos outros" (disse Bebeto Alves). Vivemos sob o reino representativo onde, infelizmente, os maiores andam comendo os menores. Salve-se quem souber (disse Gelson Oliveira).
Matraca, matraca, como te quero!
Ah, vou cansar de ti em 2006.

10 maio 2005

AINDA EM FALTA

10 maio 2005 0
Levi Nauter, 10-05-05
Reconheço que estou em falta com vocês - que para minha sorte gostam de ler o que escrevo (não sei como). Mas ando um tanto atarefado com trabalhos na faculdade. E, portanto, sem tempo. Espero que me compreendam. Enquanto isso, vamos refletir sobre o texto de outro. Um pensamento de Arthur Schopenhauer que, embora um tanto depressivo, escreve muito melhor que eu. Ele fala sobre a leitura (in Sobre livros e leitura. Trad. Philippe Humblé e Walter Carlos Costa. Porto Alegre: Paraula, 1993).
Quando lemos, outra pessoa pensa por nós: só repetimos seu processo mental. Trata-se de um caso semelhante ao do aluno que, ao aprender a escrever, traça com a pena as linhas que o professor fez com o lápis. Portanto, o trabalho de pensar nos é, em grande parte, negado quando lemos. (...) Durante a leitura nossa cabeça é apenas o campo de batalha de pensamentos alheios. Quando estes, finalmente, se retiram, que resta? Daí se segue que aquele que lê muito e quase o dia inteiro, e que nos intervalos se entretém com passatempos triviais, perde, paulatinamente, a capacidade de pensar por conta própria, como quem sempre anda a cavalo acaba esquecendo como se anda a pé. Este, no entanto, é o caso de muitos eruditos: leram até ficar estúpidos. Porque a leitura contínua, retomada a todo instante, paralisa o espírito ainda mais que um trabalho manual contínuo, já que neste ainda é possível estar absorto nos próprios pensamentos. (p. 17 e 19)

30 abril 2005

ZECA BALEIRO está falando por mim

30 abril 2005 0
Humanos que somos, nem sempre temos a inspiração necessária para escrever. Foi o que aconteceu comigo nesta semana. Além do tempo, faltou consistência no texto. Semana que vem acerto. O texto será A MATRACA NOSSA DE CADA DIA. Em época de muitos discursos, de prévias e exibicionismos vamos tentar refletir sobre as questões de representação.

Enquanto não chega o dia, fiquemos com um belo texto de Zeca Baleiro. Trata-se de 'Minha Casa', música do belo CD Líricas (2000).

É mais fácil cultuar os mortos que os vivos
Mais fácil viver de sombras que de sóis
É mais fácil mimeografar o passado
Que imprimir o futuro

Não quero ser triste
Como o poeta que envelhece
Lendo Maiakóvski na loja de conveniência
Não quero ser alegre
Como o cão que sai a passear
Com o seu dono alegre
Sob o sol de domingo
Nem quero ser estanque
Como quem constrói estradas e não anda
Quero no escuro
Como um cego tatear estrelas distraídas
(...)
 
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