12 junho 2008

LU

12 junho 2008 1
Levi Nauter


Não casei com a mulher melancia, nem com a moranguinho; tampouco com quaisquer dessas que andam por aí a procura de um ambiente a fim de se mostrarem assim por alguns trocados.


Casei com uma mulher maravilhosa. Humana, inteligente, discreta e que, mesmo em silêncio, me surpreende. Seu sorriso, sua voz, seus dedos. O corpo. As idéias, sua cosmovisão. Seu senso estético crivado de historicidade. Seu gosto musical. Aquilo para o que me faltam palavras. Tudo me encanta.


Outro dia, quando falava com ela por telefone, perguntei “que música tu estás ouvindo?”. Ela pôs o telefone perto do som e eu ouvi uma letra linda, quem tudo a ver com ela, de um CD que não nos cansamos de escutar. Leiam o trecho:


"Minha beleza não é efêmera
como o que eu vejo em bancas por aí
Minha natureza é mais que estampa
é um belo samba que ainda está por vir”


O som é lindo! Cantado com a bela voz da Céu, os instrumentos são um violão, uma caixa de fósforo e alguns efeitos de voz. Coisa de prima.


Lu, te amo!!!


CD "Céu", da cantora Céu. excelente pedida para esse dia 12. quatorze músicas muito bem tocadas, uma brasilidade à flor-da-pele

05 junho 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - sensação no concurso 2

05 junho 2008 2

Levi Nauter




[diálogos sobre a educação - sensação num concurso 2] - levi na

O céu está desabando neste domingo. Acordei cedo, tomei banho, café e estou com uma louca vontade de ficar em casa. Não posso, tenho de fazer outra prova de concurso público. De antemão sei que encontrarei questões absurdas; vou pelo menos fazer jus ao que paguei no ato de inscrição.


As ruas não possuem sinalização, nomes. Onde fica a rua que procuro? Como saber - se todas as pessoas estão 'entocadas' nas suas casas e nenhuma placa que informa? Demorei, mas encontrei. Se há um lado bom nisso foi conhecer escolas antes a mim desconhecidas.


A escola na qual tive de fazer a prova é feia. Apertada, há poucos espaços para lazer e mais parece uma prisão. É limpinha, claro - e nem poderia ser diferente. Só que isso não basta. A sala de aula possui cadeiras de todos os tipos, mesas com tamanhos diferentes. As janelas dão para uma parede de um vizinho, uma casa velha, mal pintada. Fiquei imaginando como deve ser ter aquelas aulas chatas numa sala com aquele visual.

Chegou a prova. Fiz com calma. Estranhamente eu não estava lá, mas muito mais na biografia que lia minutos antes: Dom Hélder Câmara (publicada pela Civilização Brasileira). A leitura me fora mais atraente.

Feita a prova, sei que não passei. E não pelo português, área em que sou formado. Não passei porque absurdamente (perguntem aos deuses) não sei por quanto tempo uma empresa de ônibus tem direito legal de transportar passageiros numa cidade. Muito menos sabia a qual Secretaria pertencia o Departamento de Desporto. Tampouco sabia sobre podas de árvores, sobre Defesa Civil.

Tenho absoluta convicção de que muitos outros professores serão sortudos (ou por saberem desses assuntos ou por terem feito um belo 'chute') e estarão lá. Saberei, contudo, que outros tantos na sala de aula nunca abordarão tais temas.

Ou seja, um concurso público não avalia o professor visando seu preparo "docêntico". A seleção é fria, importa o papel - literalmente. A exigência posterior será completamente contrária a do seu ingresso. Não poderá ser frio, nunca deverá considerar o aluno como um papel. Dicotomia total. Todas as formações dirigidas aos professores, todos os discursos e obras dessa área seguem um mesmo paradigma. De tempos em tempos, há uma moda a ser seguida. Houve um tempo, por exemplo, que descobriu-se o norte-americano Howard Gardner. Tudo girava em torno das múltiplas inteligências. Depois, a bola da vez passou a ser o suíço Perrenoud. Muitos nem sabem o que significa, o que quer dizer uma termo e/ou outro, mas acham um jeito de encaixar ‘habilidades e competências’ nos falares. Atualmente abrasileirou-se. Agora é afeto, amor, vida, qualidade, letramento, entre outros criativos subterfúgios.

Prefiro a poesia, o romance, o conto, a crônica etc. Estes possuem mais humanidade.

Os discursos pseudopedagógicos incomodam-me profundamente. A realidade é sempre outra. A educação está um caos. Minhas esperanças estão se esvaindo.






















ILUSTRAÇÃO: gravura do pernambucano José Francisco Borges para a obra As palavras andantes, de Eduardo Galeano, publicada pela L&PM, 5 ed., em 2007.

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - sensação no concurso 1


Levi Nauter



SENSAÇÃO NO CONCURSO - 1

Agora são 13h20m de um domingo bastante quente. Estou numa sala de aula aguardando o início das provas de um concurso público. Já enfrentei um trânsito frenético de aproximadamente cinqüenta quilômetros e cá estou entre pessoas que estudam e revisam conteúdos de concursos passados; olham, conversam com os concorrentes vizinhos; saúdam-se e dizem "quanto tempo?!". De minha parte, optei por escrever a ficar tentando aprender o que não consegui ou não quis ao longo dos dois meses anteriores. Alguns dos meus concorrentes estão nitidamente nervosos; eu também. Disperso minha tensão falando com um possível leitor. Ah, sou a única pessoa do gênero masculino - por enquanto. Não tenho problemas com isso, embora reconheça que as mulheres tenham mais paciência com os alunos do que nós. Algumas das candidatas, contudo, despertam minha curiosidade. Gostaria de vê-las ministrando aulas; estão nuns trajes muito além das possibilidades da maioria do alunado, e isso pode ser (não disse que é) um entrave.

Meu texto intenta dissipar a apreensão. A possível chatice vai ao encontro da sensação que sinto exatamente agora. Há uma pasmaceira no meu entorno.

Opa, três companheiros do meu gênero adentram a sala. Já não estou só.

É sempre boa a companhia de alguém, a solidão parece uma assinatura de incapacidade comunicativa. Não me refiro do saudável momento em que se reflete a sós, tampouco de uma burra unanimidade de opinião, que a mim equivale a estar só. Refiro-me, sim, aos momentos em que estar só pode ser o começo de uma tragédia. Nós seres humanos precisamos de companhia. O outro ratifica ou retifica nossa identidade. Nesse contexto de prova, algumas colegas parecem ter resolvido a questão pelo estômago: muito salgadinho, iogurte, bolacha, água mineral, além da ilusória H2O, são algumas das iguarias que vejo.

Ouvi, há alguns minutos, uma das conversas. "Quantas questões caem na prova?", perguntou uma senhora. "Seis de legislação, vinte e quatro de Conhecimentos Específicos e dez de Língua Portuguesa" - uma resposta firme.

Fiz perguntas a mim mesmo: por que não redação? Por que não há poesia? E a arte? Esse povo gosta de literatura? De que tipo? Gosta de música?

Nunca saberei. Apenas sei que não estudei. Não agüentei o Hernandez, o Zabala e outros tantos que mal lembro o nome. Optei por ouvir música, ler ficção, visitar minha casa nova, carregar terra, voltar das férias, pensar num filho/a. Não estou nadando no dinheiro; estou vivo. Passar num concurso exige uma morte momentânea. Morre-se para os pequenos prazeres da vida e finge-se vivo para os estudos de inutilidades (na maioria das vezes). Ressuscita-se, depois, com ou sem uma nova condição financeira.

E a sirene deu o sinal. A prova vai começar. Depois retomo a escrita.


Neste momento, às 16h, deixei a grade de respostas. Sei que não passei. Ao mesmo tempo, considero uma idiotice certas questões. As pessoas que tiverem sorte poderão dar aulas não porque sabem tudo da Constituição Brasileira, por exemplo, mas porque foram boas de chute na resposta da prova. Continuo achando que saber sobre 'mandado de segurança' em nada contribui para meu desempenho de sala de aula. Saber se 'vislumbrar' é ou não rizotônico1 pouco auxilia na minha relação com os alunos. Muito menos ajuda eu saber a ordem dos capítulos da obra de Mizukami - outra questão questionável (aliteração proposital).

Portanto, volto pra casa com os mesmos dilemas. Sei da minha dedicação ao dar aulas para o ensino médio noturno (numa escola particular). Igualmente sei que muitos medalhões palestram sobre os mesmos dilemas e ganham muito mais do que eu. Não é ciúme, claro, é a denúncia de mais uma das tantas injustiças que se comete aos professores. Fica o anúncio de que ler poesia provavelmente seja mais frutífero que ouvir o blá-blá-blá de senso comum nessa que deveria ser a área de maior investimento governamental: a educação.

O único alívio é saber que um concurso público não prova minhas habilidades (ou falta delas) na sala de aula. Ao contrário, ratifica a dicotomia entre o que se deve ensinar e o que se exige numa prova seletiva. E isso me parece lamentável e desesperançoso.

Ultimamente ando possuindo poucas esperanças com a educação.







ILUSTRAÇÃO: gravura do pernambucano José Francisco Borges para a obra As palavras andantes, de Eduardo Galeano, publicada pela L&PM, 5 ed., em 2007.



1 Significa ter a vogal tônica no radical. A forma arrizotônica é o contrário (Pulava, vendia)

 
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