20 novembro 2010

DEI PRA FICAR BOBO

20 novembro 2010 0

Levi Nauter



“A idade não é a que a gente tem, mas a que a gente sente”
Gabriel Garcia Márquez[1]





Eu sabia que a minha hora iria chegar. Já li em alguns livros e ouvi algumas palestras sobre o envelhecer. E não tenho problemas com a velhice em si. Porém, de repente, comecei a notar que algumas das minhas atitudes atuais parecem ser mais de alguém que tem pouco a perder, de alguém que, para determinadas atividades, esqueceu o pudor. Perdi algumas vergonhas.
Lembro-me que na minha profissão sempre fui (e devo dizer que ainda continuo a ser) muito discreto. Jamais fui afeito aos holofotes; prefiro os bastidores a um brilho efêmero e a uma pseudocelebridade. Aliás, minha criticidade não permite que eu veja pessoas como celebridades. Vejo a todos como pessoas, gente. Os que se destacam têm lá seus motivos – na maioria das vezes questionáveis.
Há alguns anos eu me negaria cantar e tocar numa escola. Sempre achei que isso era (e na essência ainda é) coisa para alunos e alunas. Eles precisam de bem mais oportunidades, sem contar que, em tese, um professor sabe mais dos caminhos (e possíveis atalhos), tem ou deveria ter noção de para onde vai.
Pois eu fiquei bobo.
Desde o início deste ano, resolvi que iria participar de qualquer evento cujo objetivo fosse demonstrar ao aluno e às alunas a possibilidade de fazerem mais do que vêm fazendo. A partir daí – vejam se eu posso – minha agenda não mais parou. Além da correria normal de quem trabalha 60 horas semanais, recebi convites para cantar e para – estritamente em alguns encontros de formação – imitar, digamos, os mais famosos colegas educadores do município em que trabalho.
O evento mais legal – aquele que vale destacar – foi feito na escola em que trabalho há 11 anos. Nela eu e um colega (professor de inglês e fã incondicional do Rush, além de músico do Tarcísio Meira’s Band) tocamos coisas que amamos e que são praticamente desconhecidas àqueles que têm apreço por Luan Santana, Hori, Restart entre outras quinquilharias. Com muito gosto e com a participação da colega Magda Schmidt, especialista em educação e há muito estudante de música, cantamos Titãs (das antigas), Tim Maia,  Paralamas e até um Caetano saiu. Enquanto fazíamos nosso pequeno show, os alunos estavam envolvidos em um brechó. Com as vendas adquiriram um som para ser posto no recreio – com prévia discussão das músicas que irão rodar.
Também cantei com os colegas no dia dos pais.
Outro momento especial foi a ideia da colega Lisa, professora de educação física e também responsável pela biblioteca e hora do conto. Fizemos uma semana literária na qual poderia ser apresentada qualquer produção artística envolvendo um dos poetas selecionados (Mário Quintana, Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Drummond e Vinicius de Moraes). Em geral, cada professor fez sua apresentação no turno em que trabalha. Eu decidi, de improviso, cantar O pato – do Vinicius – nos dois turnos. Foi lindo ver e ouvir a gurizada cantando brincando.
Aproximadamente um mês depois eu estava fazendo as mesmas estripolias, agora, porém, com professores de uma outra escola na qual participei de uma formação.
Sei lá, mas agora andam querendo que eu cante num evento onde estarão jovens de todo o município, principalmente os interessados em Grêmio Estudantil. Nesse evento eu cantaria apenas músicas de movimentos estudantis das décadas de 60 a 80 – ponto alto em nossa história recente. Não sei se ainda está em pé, mas a ideia é boa.
Não sei aonde isso vai dar. Sei apenas que fiquei meio bobo.
Há bobices boas de se viver.
  




[1] In MÁRQUEZ, Gabriel García. Memória de minhas putas tristes. Rio de Janeiro: Record, 2005. Trad. Eric Nepomuceno. Tradução de Memoria de mis putas tristes. Romance colombiano. Página 68. 






 
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