05 junho 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - sensação no concurso 2

05 junho 2008

Levi Nauter




[diálogos sobre a educação - sensação num concurso 2] - levi na

O céu está desabando neste domingo. Acordei cedo, tomei banho, café e estou com uma louca vontade de ficar em casa. Não posso, tenho de fazer outra prova de concurso público. De antemão sei que encontrarei questões absurdas; vou pelo menos fazer jus ao que paguei no ato de inscrição.


As ruas não possuem sinalização, nomes. Onde fica a rua que procuro? Como saber - se todas as pessoas estão 'entocadas' nas suas casas e nenhuma placa que informa? Demorei, mas encontrei. Se há um lado bom nisso foi conhecer escolas antes a mim desconhecidas.


A escola na qual tive de fazer a prova é feia. Apertada, há poucos espaços para lazer e mais parece uma prisão. É limpinha, claro - e nem poderia ser diferente. Só que isso não basta. A sala de aula possui cadeiras de todos os tipos, mesas com tamanhos diferentes. As janelas dão para uma parede de um vizinho, uma casa velha, mal pintada. Fiquei imaginando como deve ser ter aquelas aulas chatas numa sala com aquele visual.

Chegou a prova. Fiz com calma. Estranhamente eu não estava lá, mas muito mais na biografia que lia minutos antes: Dom Hélder Câmara (publicada pela Civilização Brasileira). A leitura me fora mais atraente.

Feita a prova, sei que não passei. E não pelo português, área em que sou formado. Não passei porque absurdamente (perguntem aos deuses) não sei por quanto tempo uma empresa de ônibus tem direito legal de transportar passageiros numa cidade. Muito menos sabia a qual Secretaria pertencia o Departamento de Desporto. Tampouco sabia sobre podas de árvores, sobre Defesa Civil.

Tenho absoluta convicção de que muitos outros professores serão sortudos (ou por saberem desses assuntos ou por terem feito um belo 'chute') e estarão lá. Saberei, contudo, que outros tantos na sala de aula nunca abordarão tais temas.

Ou seja, um concurso público não avalia o professor visando seu preparo "docêntico". A seleção é fria, importa o papel - literalmente. A exigência posterior será completamente contrária a do seu ingresso. Não poderá ser frio, nunca deverá considerar o aluno como um papel. Dicotomia total. Todas as formações dirigidas aos professores, todos os discursos e obras dessa área seguem um mesmo paradigma. De tempos em tempos, há uma moda a ser seguida. Houve um tempo, por exemplo, que descobriu-se o norte-americano Howard Gardner. Tudo girava em torno das múltiplas inteligências. Depois, a bola da vez passou a ser o suíço Perrenoud. Muitos nem sabem o que significa, o que quer dizer uma termo e/ou outro, mas acham um jeito de encaixar ‘habilidades e competências’ nos falares. Atualmente abrasileirou-se. Agora é afeto, amor, vida, qualidade, letramento, entre outros criativos subterfúgios.

Prefiro a poesia, o romance, o conto, a crônica etc. Estes possuem mais humanidade.

Os discursos pseudopedagógicos incomodam-me profundamente. A realidade é sempre outra. A educação está um caos. Minhas esperanças estão se esvaindo.






















ILUSTRAÇÃO: gravura do pernambucano José Francisco Borges para a obra As palavras andantes, de Eduardo Galeano, publicada pela L&PM, 5 ed., em 2007.

2 comentários:

Pr. Cláudio Moreira

Olá, Levi.

Pela primeira vez na vida, fiz a experiência do concurso público. E de tacada, resolvi fazer dois: agente administrativo da prefeitura de Santa Margarida, perto da minha cidade, e outro pra secretário de diligências do Ministério Público.
Não estudei uma linha. Fiz os dois pela honra da firma, pra não botar fora o dinheiro da inscrição, e porque eu queria viver essa experiência. Fui relativamente bem nos dois, especialmente pelas questões de direito administrativo, mais por causa da minha experiência recente como diretor da Câmara de minha cidade durante 2007 do que por qualquer outra coisa. Fui bem, mas não o suficiente para assumir as vagas.
Não pude fazer para Educação porque, por razões financeiras, tranquei a faculdade de Letras um ano perto de me formar. Mas, ainda assim, acho que não faria. Em Santa Margarida, por exemplo, a exigência para preencher a vaga dos professores era apresentar uma batelada de titulações, para receber uma remuneração que diferia da de zelador em apenas um real. Pra menos.
É por isso que a educação no Brasil precisa ser tratada como prioridade...mas eu, que por dever e vocação sempre tenho esperanças, começo a ficar constrangido quando penso no assunto.

Deus te abençoe, Levi, e obrigado pela reflexão proporcionada.

Intransitiva

Querido e, sempre, colega!
Ao ler o teu texto identifiquei-me com a tua revolta e com o teu desânimo.
Não é "debalde" que desanimei da nossa profissão e me rendi ao universo corporativo da administração.
Menos encantador, mais prático.
É duro estudarmos por amor, por utopia, escolher uma profissão por acreditar que o mundo tem conserto e, depois, descobrir que isso, no teu contexto, é secundário....e o que importa é sempre o eleitoreiro...os títulos...a experiência...
Quem tem que acreditar, não acredita.E se renova todo ano o ciclo de falta da educação, da informação e do senso crítico entre nossos alunos.
Cansei de ir a escolas...e me olharem de cima, como a "professorinha novinha, toda entusiasta que vai chegar na nossa escola desacomodando nossas aulas enfadonhas e teorias educacionais mortas, xô professorinha".
É assim que me sinto: "Xô professorinha entusiasta". É um balde de água fria...
E lá vou eu pras planilhas financeiras...
Educação, para mim, continua sendo uma utopia, um sonho. Como dizia o Brizola..."precisamos de utopia e nem sempre elas são para serem alcançadas".Talvez seja isso.
Abraço, companheiro!
A luta continua, ou não.Como diria Caetano.
Ass. Liliana.

 
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