“Se o livro que estamos lendo não nos despertar, como se um martelo golpeasse o nosso crânio, então por que razão nós devemos lê-lo?... Um livro deve ser como uma machadinha para romper a espessa camada de gelo em nosso interior.”
Franz Kafka
Apud Eugene Peterson, em Corra com os cavalos..., editora Ultimato.
Eu sei das minhas casmurrices. Sei que deveria, com meus trinta e cinco anos, ter superado certos medos. Estou ciente de uma maturidade que insiste em contradizer-me de quando em quando.
Seria bom se a gente conseguisse bem viver o tempo todo. Enriquecedora seria a vida se a olhássemos mais pedagogicamente. Eu gostaria de saber dosar razão e emoção.
Ah, quem dera eu fosse sempre acertivo. E se eu fosse o melhor entre os melhores? Se eu fosse um Salomão? Se eu tivesse fortuna financeira e, na mesma medida, fortuna intelectual?
Mas não, eu sou uma incógnita.
Eu deveria ser mais informado sobre os assuntos da vida. Poderia saber plantar e regar flores. Seria bom se eu fosse um exímio pedreiro, carpinteiro, pintor, mecânico, eletricista, programador, contador, cantor, poeta. Faria bem ao meu bolso e a minha imagem se eu fosse uma reconhecidacelebridade. E se eu pousasse nu? E de boa pinta num reality show?
Também podia ter Orkut, Facebook ou Sonico e neles fazer biquinho e trejeito de ‘descolado’. E o Twitter? E o torpedo? E o MSN? Quem dera eu tivesse a palavra certa na hora certa de dizê-la. E se eu soubesse tudo da crise econômica? E se eu fosse um bom político? E se a minha palavra tivesse peso?
Talvez um dia eu chegue lá.
Há um misto de sonhos, esperanças e desesperanças em mim.
Interesso-me por cotidianidades, variedades, celebridades, política, cultura, sexualidade, família, casamentos, relacionamentos, filhos, filhotes, boicotes. Eu gostaria de saber de tudo sobre tudo. Sobretudo, a respeito da felicidade.
Mas eu sou o que apregoou Belchior: “um rapaz latino-americano, sem dinheiro no bolso”. Também me coaduno com o conterrâneo Nei Lisboa: “um latino quase inteligente”.
Acaba, então, que me interesso por tudo, absolutamente tudo. E não se nada. Aí essa semana fui ajudar na limpeza da minha casa (coisa que faço regularmente, ressalte-se) e ouvi um CD dos anos 80 – tempo em que sonhava ter a idade que tenho. Kid Abelha me fez ouvir mais de uma vez a música que resumiu meu estado:
“eu tenho pressa e tanta coisa me interessa, mas nada tanto assim”
Estou na idade (ou no tempo) em que o filtro age mais. Elegi prioridades e optei pela minha família. Minha mulher, minha filha (das quais não sou dono), meus livros, meus CDs musicais e meus poucos amigos são os antídotos contra o veneno de estar vivo. O resto é para o tempo que sobra, se e quando sobra.
Veja o que ocorre enquanto se espera por uma consulta médica.
LEVI NAUTER DE MIRA, doutorando em educação (UNISINOS), mestre em educação (UNISINOS) e graduado em Letras-português e literatura (ULBRA). Tenho interesse em livros de filosofia, sociologia, pedagogia e, às vezes, teologia. Sou casado com a Lu Mira, professora de História, e pai da linda Maria Flor. Adoramos filmes e séries.