12 junho 2008

LU

12 junho 2008 1
Levi Nauter


Não casei com a mulher melancia, nem com a moranguinho; tampouco com quaisquer dessas que andam por aí a procura de um ambiente a fim de se mostrarem assim por alguns trocados.


Casei com uma mulher maravilhosa. Humana, inteligente, discreta e que, mesmo em silêncio, me surpreende. Seu sorriso, sua voz, seus dedos. O corpo. As idéias, sua cosmovisão. Seu senso estético crivado de historicidade. Seu gosto musical. Aquilo para o que me faltam palavras. Tudo me encanta.


Outro dia, quando falava com ela por telefone, perguntei “que música tu estás ouvindo?”. Ela pôs o telefone perto do som e eu ouvi uma letra linda, quem tudo a ver com ela, de um CD que não nos cansamos de escutar. Leiam o trecho:


"Minha beleza não é efêmera
como o que eu vejo em bancas por aí
Minha natureza é mais que estampa
é um belo samba que ainda está por vir”


O som é lindo! Cantado com a bela voz da Céu, os instrumentos são um violão, uma caixa de fósforo e alguns efeitos de voz. Coisa de prima.


Lu, te amo!!!


CD "Céu", da cantora Céu. excelente pedida para esse dia 12. quatorze músicas muito bem tocadas, uma brasilidade à flor-da-pele

05 junho 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - sensação no concurso 2

05 junho 2008 2

Levi Nauter




[diálogos sobre a educação - sensação num concurso 2] - levi na

O céu está desabando neste domingo. Acordei cedo, tomei banho, café e estou com uma louca vontade de ficar em casa. Não posso, tenho de fazer outra prova de concurso público. De antemão sei que encontrarei questões absurdas; vou pelo menos fazer jus ao que paguei no ato de inscrição.


As ruas não possuem sinalização, nomes. Onde fica a rua que procuro? Como saber - se todas as pessoas estão 'entocadas' nas suas casas e nenhuma placa que informa? Demorei, mas encontrei. Se há um lado bom nisso foi conhecer escolas antes a mim desconhecidas.


A escola na qual tive de fazer a prova é feia. Apertada, há poucos espaços para lazer e mais parece uma prisão. É limpinha, claro - e nem poderia ser diferente. Só que isso não basta. A sala de aula possui cadeiras de todos os tipos, mesas com tamanhos diferentes. As janelas dão para uma parede de um vizinho, uma casa velha, mal pintada. Fiquei imaginando como deve ser ter aquelas aulas chatas numa sala com aquele visual.

Chegou a prova. Fiz com calma. Estranhamente eu não estava lá, mas muito mais na biografia que lia minutos antes: Dom Hélder Câmara (publicada pela Civilização Brasileira). A leitura me fora mais atraente.

Feita a prova, sei que não passei. E não pelo português, área em que sou formado. Não passei porque absurdamente (perguntem aos deuses) não sei por quanto tempo uma empresa de ônibus tem direito legal de transportar passageiros numa cidade. Muito menos sabia a qual Secretaria pertencia o Departamento de Desporto. Tampouco sabia sobre podas de árvores, sobre Defesa Civil.

Tenho absoluta convicção de que muitos outros professores serão sortudos (ou por saberem desses assuntos ou por terem feito um belo 'chute') e estarão lá. Saberei, contudo, que outros tantos na sala de aula nunca abordarão tais temas.

Ou seja, um concurso público não avalia o professor visando seu preparo "docêntico". A seleção é fria, importa o papel - literalmente. A exigência posterior será completamente contrária a do seu ingresso. Não poderá ser frio, nunca deverá considerar o aluno como um papel. Dicotomia total. Todas as formações dirigidas aos professores, todos os discursos e obras dessa área seguem um mesmo paradigma. De tempos em tempos, há uma moda a ser seguida. Houve um tempo, por exemplo, que descobriu-se o norte-americano Howard Gardner. Tudo girava em torno das múltiplas inteligências. Depois, a bola da vez passou a ser o suíço Perrenoud. Muitos nem sabem o que significa, o que quer dizer uma termo e/ou outro, mas acham um jeito de encaixar ‘habilidades e competências’ nos falares. Atualmente abrasileirou-se. Agora é afeto, amor, vida, qualidade, letramento, entre outros criativos subterfúgios.

Prefiro a poesia, o romance, o conto, a crônica etc. Estes possuem mais humanidade.

Os discursos pseudopedagógicos incomodam-me profundamente. A realidade é sempre outra. A educação está um caos. Minhas esperanças estão se esvaindo.






















ILUSTRAÇÃO: gravura do pernambucano José Francisco Borges para a obra As palavras andantes, de Eduardo Galeano, publicada pela L&PM, 5 ed., em 2007.

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - sensação no concurso 1


Levi Nauter



SENSAÇÃO NO CONCURSO - 1

Agora são 13h20m de um domingo bastante quente. Estou numa sala de aula aguardando o início das provas de um concurso público. Já enfrentei um trânsito frenético de aproximadamente cinqüenta quilômetros e cá estou entre pessoas que estudam e revisam conteúdos de concursos passados; olham, conversam com os concorrentes vizinhos; saúdam-se e dizem "quanto tempo?!". De minha parte, optei por escrever a ficar tentando aprender o que não consegui ou não quis ao longo dos dois meses anteriores. Alguns dos meus concorrentes estão nitidamente nervosos; eu também. Disperso minha tensão falando com um possível leitor. Ah, sou a única pessoa do gênero masculino - por enquanto. Não tenho problemas com isso, embora reconheça que as mulheres tenham mais paciência com os alunos do que nós. Algumas das candidatas, contudo, despertam minha curiosidade. Gostaria de vê-las ministrando aulas; estão nuns trajes muito além das possibilidades da maioria do alunado, e isso pode ser (não disse que é) um entrave.

Meu texto intenta dissipar a apreensão. A possível chatice vai ao encontro da sensação que sinto exatamente agora. Há uma pasmaceira no meu entorno.

Opa, três companheiros do meu gênero adentram a sala. Já não estou só.

É sempre boa a companhia de alguém, a solidão parece uma assinatura de incapacidade comunicativa. Não me refiro do saudável momento em que se reflete a sós, tampouco de uma burra unanimidade de opinião, que a mim equivale a estar só. Refiro-me, sim, aos momentos em que estar só pode ser o começo de uma tragédia. Nós seres humanos precisamos de companhia. O outro ratifica ou retifica nossa identidade. Nesse contexto de prova, algumas colegas parecem ter resolvido a questão pelo estômago: muito salgadinho, iogurte, bolacha, água mineral, além da ilusória H2O, são algumas das iguarias que vejo.

Ouvi, há alguns minutos, uma das conversas. "Quantas questões caem na prova?", perguntou uma senhora. "Seis de legislação, vinte e quatro de Conhecimentos Específicos e dez de Língua Portuguesa" - uma resposta firme.

Fiz perguntas a mim mesmo: por que não redação? Por que não há poesia? E a arte? Esse povo gosta de literatura? De que tipo? Gosta de música?

Nunca saberei. Apenas sei que não estudei. Não agüentei o Hernandez, o Zabala e outros tantos que mal lembro o nome. Optei por ouvir música, ler ficção, visitar minha casa nova, carregar terra, voltar das férias, pensar num filho/a. Não estou nadando no dinheiro; estou vivo. Passar num concurso exige uma morte momentânea. Morre-se para os pequenos prazeres da vida e finge-se vivo para os estudos de inutilidades (na maioria das vezes). Ressuscita-se, depois, com ou sem uma nova condição financeira.

E a sirene deu o sinal. A prova vai começar. Depois retomo a escrita.


Neste momento, às 16h, deixei a grade de respostas. Sei que não passei. Ao mesmo tempo, considero uma idiotice certas questões. As pessoas que tiverem sorte poderão dar aulas não porque sabem tudo da Constituição Brasileira, por exemplo, mas porque foram boas de chute na resposta da prova. Continuo achando que saber sobre 'mandado de segurança' em nada contribui para meu desempenho de sala de aula. Saber se 'vislumbrar' é ou não rizotônico1 pouco auxilia na minha relação com os alunos. Muito menos ajuda eu saber a ordem dos capítulos da obra de Mizukami - outra questão questionável (aliteração proposital).

Portanto, volto pra casa com os mesmos dilemas. Sei da minha dedicação ao dar aulas para o ensino médio noturno (numa escola particular). Igualmente sei que muitos medalhões palestram sobre os mesmos dilemas e ganham muito mais do que eu. Não é ciúme, claro, é a denúncia de mais uma das tantas injustiças que se comete aos professores. Fica o anúncio de que ler poesia provavelmente seja mais frutífero que ouvir o blá-blá-blá de senso comum nessa que deveria ser a área de maior investimento governamental: a educação.

O único alívio é saber que um concurso público não prova minhas habilidades (ou falta delas) na sala de aula. Ao contrário, ratifica a dicotomia entre o que se deve ensinar e o que se exige numa prova seletiva. E isso me parece lamentável e desesperançoso.

Ultimamente ando possuindo poucas esperanças com a educação.







ILUSTRAÇÃO: gravura do pernambucano José Francisco Borges para a obra As palavras andantes, de Eduardo Galeano, publicada pela L&PM, 5 ed., em 2007.



1 Significa ter a vogal tônica no radical. A forma arrizotônica é o contrário (Pulava, vendia)

29 maio 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - leituras

29 maio 2008 1

Levi Nauter



DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO

Abençoado seja o espírito de curiosidade (...) uma vez mais seja louvado o deus dos curiosos

José Saramago



Meu café está sobejadamente maravilhoso. Olho para o pátio da nova casa, a chuva faz aquele burburinho irresistível nos convidando para dormir ou assistir a um bom filme. Nada disso posso fazer agora. Mas não reclamo. Não reclamo, porém dou-me o luxo de parar a correção das aproximadamente 40 redações que me olham desaforadas. Sobre a mesa, repousam ‘Cabeça de porco’1 – obra que um dos meus alunos do ensino médio pediu que eu lesse – e ‘Crônicas de educação’2, obra da maravilhosa Cecília Meireles. Se eu pudesse, largaria tudo para me dedicar somente à leitura desses dois livros. Por ora isso não me é possível.

Ah, não posso deixar de fazer menção à música que serve de cortina para este texto. Trata-se do ótimo trabalho do guri John Mayer e seu CD ‘Room for squares’3 (como é bom ir a um balaio de grandes magazines e encontrar pérolas).



A pausa que dei nas redações para escrever este texto tem a ver com a leitura. Em outra escola que trabalho, recebemos a revista ‘Carta na Escola’ sistematicamente. E nessa última edição, um texto do professor Edmir Perroti chamou minha atenção. Em Sonhos e bibliotecas4 ele discorre sobre o quanto poderia ser útil uma biblioteca pública atual. Faz um pequeno levantamento histórico da situação em São Paulo, a partir dos anos 30, terminando com uma severa crítica aos ‘depósitos’ de livros, bem como sugere discretamente algumas alternativas.

Sinceramente, eu gostaria de crer que todas as/os bibliotecárias/os e auxiliares de biblioteca (ou outro nome que se queira dar) lessem tal artigo. Mais que isso, captassem não só a crítica mas as possíveis alternativas de reversão do quadro caótico que essas casas se encontram. Sou sócio em três bibliotecas públicas e em quase todas lembro da minha infância, ou tempo escolar.

Nunca esquecerei minha primeira ida a uma biblioteca escolar. Estava na quarta série, último ano de unidocência. Deveriam preparar-me para a multiplicidade de componentes curriculares; resolveram começar pela famigerada ‘casa de livros’. A professora-bibliotecária era uma anciã que botava medo em todos nós. Sua carranca não poupava nem os próprios colegas de profissão. Era impaciente com os curiosos alunos, entre os quais me incluía; odiava ser contrariada; amava mandar alunos “para a diretoria” - no tempo em que lecionava ciências. Agora, estropiada pelo tempo, fora colocada no seu derradeiro afazer: cuidar de livros. Fechados, os livros não resmungam, não contrariam, não retificam nem ratificam nada. São como os mortos. Abertos, vivos, fazem o que bem descreveu Caetano Veloso na sua poesia-música chamada ‘Livros’5: lançar mundos no mundo. Na mesma música, ele diz que “os livros são objetos transcendentes”, mas se pode amá-los “do amor táctil”. Pois na minha primeira vez na biblioteca isso era impossível. “Nada de tocar nos livros”, disse com voz cansada, “peçam para mim”. Visitamos todos os corredores, sentamos todos numa mesa parecida com a da Santa Ceia; recebemos o mesmo livro didático, abrimos na mesma página e lemos o mesmo texto: As Bodas. Não sei quem é o autor até hoje (talvez Freud explique), mas lembro-me muito bem do título. No ensino médio retomei minhas incursões à biblioteca; à noite, não havia bibliotecária. Era uma festa, eu pegava os livros, folheava-os, cheirava-os, dava leves batidinhas com os dedos para ouvir os sons que deles saíam. Desde então, música e leitura fazem parte de mim.

A biblioteca não pode simplesmente existir, entregando ao acaso sua dinamização” (p.41), afirma o professor Perrotti. É necessário estratégias, metas, eventos, entre outras iniciativas que visem trazer os leitores, os novos leitores e os não leitores. Dentre as sugestões do artigo está o “buscar e coletar a memória da comunidade, registrá-la, dar-lhe forma e sentido, recriá-la, disponibilizá-la sob diferentes formas, como exposições, boletins, livros e álbuns fotográficos” (p. 41). Eu acrescentaria a indispensável parceria entre os professores de linguagem com os servidores da biblioteca (pública ou escolar). Acho, por exemplo, que poderiam ser feitas oficinas de textos na biblioteca e não numa sala de aula; ou seja, uma oficina de texto rodeada de livros de todos os gêneros. Sessões de filmes, documentários e vídeos em geral cujo tema central seja a leitura e/ou a escrita pode ser uma alternativa.

Sobretudo, necessitamos de profissionais que gostem de ler. Há muita gente ‘escorada’ na biblioteca, isto é, não serve para a sala de aula nem para uma função mais administrativo-burocrática. A biblioteca não deveria ficar a mercê de quem odeia livros, produção textual. Mas não falo da leitura mecânica, aquela em que se lê para fazer um trabalho (apresentar aos colegas). Também não falo da leitura do Zeca (já que ninguém gava...) cujo objetivo é simplesmente estatístico: “já li tantos livros esse ano!”. Esse tipo de leitura é deseducativa, desestimulante e desgraçada. Essas leituras, paradoxalmente, cegam. Muito menos falo da leitura para “tirar uma mensagem” (conheço professores que me perguntam: “você tem alguma passagem de livro pra gente usar como mensagem no evento tal?”. Huurrrrrrr). Refiro-me à leitura que mescla prioritariamente o prazer. Que prazer? Do ato de ler, do lugar em que se está para ler, dos acompanhamentos da leitura (um café, uma música instrumental, um bloco para anotações, caneta ou lápis). Falo também do prazer de desenvolver a percepção daquilo que está escrito, ou seja, notar o suor do autor para dizer muito em poucas linhas; observar como foi dito o que se leu e poderia ter sido dito de uma outra forma. O prazer estético entranhado no jogo das palavras, na escolha e lapidação de cada frase, oração, período, parágrafo, capítulo. O prazer de verificar a liberdade do autor e o uso inteligente da mesma. Prazer, parece-me, também é esquecer o mundo real por alguns minutos ou horas e, tendo assinado um contrato de mentirinha com o autor6, mergulhar noutro mundo.

Como síntese do parágrafo anterior, diria que a pessoa atuante na biblioteca precisa ser mais exigente. Tem de conhecer o seu espaço, saber que livros estão por perto, quais ainda faltam, ter um certo nível de informação (não necessariamente de conhecimento) a respeito do acervo (o máximo possível) e, uno-me a Pennac7,

...é preciso dizer se é um romance, um ensaio, uma antologia de contos, uma coletânea de poemas, que a palavra “livro”, em si, na sua aptidão de tudo designar, não diz nada de preciso, um catálogo telefônico é um livro, assim como um dicionário, um guia turístico, um álbum de selos, um livro de contabilidade...

O serviço de biblioteca exige bem mais que uma pessoa que não deu certo em algum lugar. Se queremos uma educação de qualidade, uma geração de leitores e uma nova perspectiva estética temos de apressar o diálogo, as políticas públicas e privadas, bem como as ações efetivas.

Está lançado o debate. Continuemos!

1 Obra de Celso Athayde, MV Bill e Luiz Eduardo Soares, publicada em 2005 pela editora Objetiva.

2 A obra é uma parceria da Fundação Biblioteca Nacional e editora Nova Fronteira e publicada em 2001. recomendo a todos os professores e/ou educadores.

3 O CD (Sony-BMG) foi lançado em 2001 e é atualíssimo. Para quem não conhece o cara, sugiro que digite o nome John Mayer no YouTube e curta um monte de coisas boas. Há um show com a Norah Jones de tirar o chapéu e com a londrina que virou tema de novela brasileira, além de um show acústico no qual ele canta a boa ‘Neon’. Vale conferir.

4 Refiro-me a edição de maio, pp. 40-41. O site, na versão eletrônica, é www.cartanaescola.com.br

5 Há o clipe dessa música no DVD Prenda Minha.

6 Sobre esse assunto, vale a leitura de um bom livro: ‘Seis passeios pelos bosques da ficção’, de Umberto Eco, publicado pela Cia. das Letras.

7 PENNAC, Daniel. Como um romance. Tradução de Leny Werneck. Rio de Janeiro: Rocco, 1993. tradução de Comme um roman. (p. 23)




ILUSTRAÇÃO
de Eva Furnari para o seu livro ADVINHE SE PUDER, 2.ed., Ed. Moderna, 2002.



06 maio 2008

[notas musicais - showzaço] – levi nauter

06 maio 2008 1




Na minha singela opinião, um bom show precisa ter duas características: (1) a hora passa correndo e (2) os espectadores têm diversas sensações. E penso isso por considerar que a música tem o poder de tocar corações, emoções, em que pese ser arte e não ter, portanto, esse compromisso ‘a priori’.


Eu e a Lu fomos ao Theatro São Pedro domingo, dia 27-04-08, às 18h. Saímos uma hora e meia depois mais leves, mais alegres, mais sensibilizados. Amando ainda mais a boa e versátil música brasileira. Assistimos ao show de lançamento do CD ‘Noites de gala, samba na rua’, da maravilhosa Mônica Salmaso, com participação – tanto no show quanto no CD – do grupo Pau Brasil (um quinteto sensacional que conta com grandes nomes da música instrumental: Nelson Ayres – piano; Paulo Bellinati – violão e cavaquinho; Teco Cardoso – sax e flautas; Rodolfo Stroeter – baixo; Ricardo Mosca – bateria e percussão). Todas as músicas são de autoria do sempre bom Chico Buarque.


Mas o bom do show é que a gente consegue ter a comprovação do quanto é maravilhosa a voz da Mônica. Ela não desafina um instante, faz solos junto com as flautas, com o piano. Seu ritmo é perfeito e provavelmente explicável porque ela também faz percussão em algumas músicas. O teatro estava lotado e todas as pessoas cantavam alegremente as canções. Num momento de rara beleza e sensibilidade, ouvia-se o fungar das pessoas em meio a entoação de ‘Você você’, música que Chico compôs para o neto. Em ‘Quem te viu, quem te vê’ a platéia mal se segurava na poltrona, que vontade de dançar! ‘Morena dos olhos d’água’, com baixo e piano foi uma bela surpresa. Os arranjos em contratempo da bela ‘Bom tempo’ quase encerrava o espetáculo que ainda reservava ‘Beatriz’ com o primoroso piano do Nelson.


Foi um show lindo, que instigava a aquisição dos raros CDs que ainda restavam no hall de entrada. Voltei pra casa embalado pelo meu exemplar. E ouvi-lo depois de escutar as histórias de sua produção é ainda mais interessante, ganha mais significado.


Suavidade, sensibilidade, virtuosismo e simplicidade marcaram a noite.


Fiquei sabendo mais tarde que este fora o show mais lotado do final de semana. A cantora e compositora Vanessa da Mata estava por aqui. Desafina bastante ao vivo, mas os três CDs valem a pena – tanto pelo instrumental bem alinhado quanto pela conceituação das letras. Maria Rita, que apelou pelo modismo midiático do samba, também estava na capital. Considero-a uma boa cantora e a admirava mais antes da fama, quando participava de músicas instrumentais (como no bom CD do Chico Pinheiro). Nenhum deles, conforme informações jornalísticas, lotaram tanto quanto as duas noites de ingressos esgotados da Mônica. Estive lá, estava excelente.



Salve, Mônica! Salve Pau Brasil! Viva a música brasileira!!!

27 fevereiro 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - de volta ao batente

27 fevereiro 2008 2
Levi Nauter
Não porque eu não goste de trabalhar, mas porque adoro estar em casa, é com certa tristeza que retorno ao batente – por um lado. Por outro, em contraposição, há uma alegria e uma expectativa com o início do ano. Ainda tenho tempo para planejamentos. Na verdade sinto excitação por deixar uma determinada rotina para assumir outra, agora mais complicada.

Neste ano terei três locais de trabalho: um público, dois privados. Meu contato com alunos será bem maior. Meu tempo dedicado a leituras bem menor. Terei de me espremer para conseguir um tempo a fim de poder registrar minhas encucações e elucubrações. De uma parte estarei como imaginava, trabalhando muito. De outra, não exatamente como queria: sem tempo pra nada. Vida de professor com contas a pagar.

Fico pensando: será que darei conta? Conseguirei cativar – no bom sentido – os alunos? Como vai ser minha relação com os colegas? Como corrigir trabalhos e provas de tanta gente? E as minhas leituras? E o tempo que ficava em frente ao computador pensando numa palavra, numa frase ou num parágrafo melhor para dizer o que penso? E os finais de tarde balançados por muita música?

Pois agora tudo muda. Volto a acordar às 5h30m, mas agora com a novidade de ir, depois das 17h, para um outro local no qual ficarei até às 22h. Aos sábados, minha atividade docente continuará, intercalada – às vezes só à tarde, às vezes o dia todo. Menos mal que nesse mesmo ritmo estará minha esposa. A Lu e eu formamos um casal de fibra. Assim, mais do que nunca, os poucos momentos juntos serão intensos.

Finalmente terei a desculpa de que o texto está ruim devido a falta de tempo. Agora, por exemplo, é uma hora da manhã (como corrigir um texto a essa hora?). Estou digitando e ouvindo o relaxante Norman Brown e a bela música ‘You keep lifting me higher’, um “smooth jazz” de primeira linha. Mas ninguém é de ferro, tenho que dormir.

Boa noite!

14 fevereiro 2008

[cuidado, lá vêm eles] – levi nauter

14 fevereiro 2008 1

Levi Nauter






Esse é o ano. Agora todos sairão das tocas, visitarão todos os lugares possíveis. Nos três anos anteriores esqueceram-se de nós, surrupiaram nosso suado e ardido dinheirinho. Para eles viverem bem, pegamos ônibus todos os dias, amassamos o barro e, nas vias públicas, somos molhados pelas poças d’água devido a buraqueira e a inércia de algumas autoridades. Raramente eles estiveram conosco. E quando ligávamos, a secretária, treinada para ser gentil, dizia: “ele não pode atender no momento”; ou eles estavam perdidos (“não se encontra”).


Mas tudo muda a partir de agora. Quando menos você esperar eles vão chegar. Virão com roupas simples, parecendo um de nós. Nunca se cansarão de apertar nossas mãos, estarão sempre sorrindo. Comerão picanha e risólis, lazanha e coxinha de galinha frita. Tomarão qualquer tipo de refri, suco de fruta ou os famosos ‘kisucos’ e, pasmem, até água. Plantarão árvore, ajudar-nos-ão a lavar a calçada. Vão dar de presente um saco de cimento ou uma passagem até o centro – quiçá uma carona. Dirão que somos especiais, que temos muito potencial, que poderemos ir longe e que isso dependerá só de nós.


Tudo isso com foto. Claro! Atrás, ao lado, na frente sempre haverá uma câmera fotográfica. Não há candidato político sem um fotógrafo e uma menina com um caderno de anotações. Nele serão anotados os seus pedidos, as suas queixas, os seus elogios. Virá a público somente os elogios do tipo “fulano de tal tem 90 % de aprovação”. E a foto do senhor ou da senhora lá estará estampando um jornal ou o ‘santinho’.
Cuidado! A senhora ou o senhor não são patrões. Não se iluda. Um voto mal dado não será recuperado depois. Eles, sim, são patrões. Aprovam o próprio aumento salarial e ainda podem tirar de nós as míseras vantagens conquistadas ao longo de anos e anos. Nós, contribuidores e sustentadores desse sistema é que somos os que pagam tudo. E a culpa dos possíveis erros nunca será deles: ou será do sistema (que nunca tem alguém com nome) ou dos governos anteriores. Eles nunca errarão. Pouco importa se o governo daqui é o mesmo de lá, as opiniões podem ser incoerentes. Há boas explicações para tudo. E se não há? Assumem com cara de piedade, pedem desculpas e tocam o barco.


E tem mais. Provavelmente se eles não forem até sua casa, mandarão seus agentes políticos. Isso mesmo, aqueles que depois terão empregos quase garantidos – tirando a sua vaga pela falta de concurso público. Não interessa a profissão do agente, ele tem de agir, precisa abocanhar o maior número de votos possível.
E aí? Aí que nós pagamos essa conta toda e é necessário dar um basta.


Fiquemos de olhos bem abertos e ouvidos sempre atentos.
Vamos cortar o mal pela raiz.
Cuidado com eles.





DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO - minha mangueira


Levi Nauter





Não sou aficionado por carnaval. Falta-me a paciência para ficar perdendo tempo na frente da televisão vendo aquelas fantasias que me parecem horríveis. Igualmente não suporto aquelas pseudo-estrelas da TV rebolando como se tivessem sido convidadas pelas escolas de samba – quando, a bem da verdade, rolam milhões nos bastidores. Ademais, não tenho vontade de aumentar o IBOPE nem da Globo (que transmite o carnaval carioca e paulista) nem da Band (que transmite, digamos, os alternativos da Bahia e Pernambuco).
Contudo, adorei estudar a temática para o meu TCC. Mikhail Bakhtin foi meu guru por um bom tempo; com ele aprendi a entender algumas coisas que ainda hoje acontece. Mas isso é assunto para um outro texto.
Não quero dissertar sobre o carnaval.


Quero falar sobre Paulo Freire.


Antes, quero dizer que estou preparando – na casa nova – uma sala que já possui nome: mangueira. Para quem não sabe da minha história, digo “aqui será meu gabinete”, “minha sala de estudos”. Mas aos íntimos confesso: essa é a minha mangueira. Donde tirei a idéia? Aí é que está.
Li com afinco um livro bem legal de Freire: “À sombra desta mangueira”[1]. A obra me inspirou a outros textos, outras reflexões que, por ora, estão na gaveta.
Numa passagem, o professor Paulo fala de como aprendeu sobre o mundo e sobre a palavra. Muito de sua aprendizagem se deu sob as sobras das árvores. Ele mesmo afirma que o título de seu livro, então, é uma espécie de licença poética e homenagem. Eu realmente achei isso poético e quero levar essa poesia até minha casa. Minha experiência de ter árvores no pátio não foi muito promissora. De quando criança só lembro de bergamoteiras e laranjeiras. Todas possuíam espinhos. Ou seja, a didática não era tão boa. Aliás, espero não estar sendo um professor espinhento. Agora, no entanto, na casa nova, terei sete pés de ipê amarelo e mais dois que terei de descobrir o nome, alem de um coqueiro que embelezará a frente. Possivelmente apreenderei mais do livro na medida em que por lá estiver morando.
Fecho esse anúncio com a frase que fez a diferença:

“Minha biblioteca de adulto tem algo disso. Às vezes, é como se fosse a sombra da mangueira de minha infância. ”(p. 16)

E acrescento outras concordâncias, sabendo que nesse gabinete-mangueira muitas vezes estarei só, “escondido do mundo e dos outros, fazendo-me perguntas ou discursando, nem sempre provocado por minhas perguntas” (p. 17). Nesse cantinho ratificarei “primeiro, que posso saber melhor o que já sei; segundo, que posso saber o que ainda não sei; terceiro, que posso produzir conhecimento ainda não existente” (p. 18). Afinal, “a coisa hoje impossível pode vir a ser possível um dia” (p. 82).
Que venha o dia!














[1] FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira. 4.ed. São Paulo: Olho d’água, 2004.

29 janeiro 2008

DIÁLOGOS SOBRE A EDUCAÇÃO [na pressão]

29 janeiro 2008 1

Levi Nauter




Há pouco ouvi “Na pressão”, com o maravilhoso Lenine[1] e, terminada a canção, fiquei pensando em um outro tipo de pressão que estou vivendo. Esse é um ano de concursos públicos, em diversas áreas. Na da educação, tenho procurado ‘entrar pela porta da frente’ – ser um professor nomeado. Ou seja, estou buscando uma das poucas vagas à disposição na região metropolitana, onde moro. Aí está a pressão.
Em 2007 ansiava pelos dias nos quais poderia – mais calmamente – ler aquelas obras que fui deixando de lado devido os afazeres profissionais. Os feriados do final de ano me fizeram ler avidamente. Cerquei-me das aquisições literárias, bem como dos empréstimos, mas não esqueci do que parece ser fundamental na área de minha formação. Contudo, ocorreu um problema.


Estavam sendo ‘devorados’: minha principal aquisição teológica, “Pecados do espírito, bênçãos da carne”, do teólogo americano Mathew Fox. Também passaram a ser lidos em doses homeopáticas “O caçador de pipas”, do afegão Hosseini; “A menina que roubava livros”, do australiano Zusak; “O Deus das pequenas coisas”, da indiana Arundhati Roy (estes, empréstimos da minha cunhada e educadora Ane de Mira). “Ética”, do teólogo e filósofo alemão Bonhoeffer, presente de uma mãe de aluno, terá de aguardar no gabinete; assim como o professor/pesquisador e teórico da análise do discurso Van Dijk
[2]. Na pequena cidade onde moro, faço um esforço para não passar na frente da aconchegante biblioteca pública na qual sou sócio. Estou na pressão de não poder ler exatamente o que quero.
As causas são os concursos públicos.


Sim, eles são os vilões. Claro que intento passar, claro que penso em ser o melhor professor possível. Devo esclarecer, desde logo, que não vislumbro um acomodamento pós-estágio probatório. Tampouco me imagino cansando da busca pela excelência. Afinal, querer e buscar o aprimoramento parece estar na minha gênese profissional. Igualmente a consciência de que não sou melhor que ninguém. Talvez diferente, nada mais.
Ocorre que um concurso público me força a ler autores e obras a mim extremamente chatas. Eu leio Paulo Freire constantemente porque um dia quero ser freireano; hoje estou tentando ser. Mas, sobretudo, leio-o não porque alguém disse que eu deveria lê-lo. Leio porque nossa história, guardadas as devidas proporções, em alguns momentos é próxima. Leio-o como um curioso, como alguém que quer contextualizá-lo (seguindo seu próprio conselho), como alguém que gosta de ouvir histórias de vidas. Leio Freire porque aprendo sobre um Brasil que não está nas novelas. Não o leio para passar num concurso, nem para escrever sobre ele (muitos há que fazem isso muitíssimo melhor que eu). Lê-lo me faz bem e isso basta.


No entanto, um concurso me força a ler uma gente que não conhece a minha realidade. Autores que, com raras exceções, não conhecem dificuldade, pobreza, falta de grana e de oportunidades profissionais. As seleções mais parecem um bom negócio porque não cobram um preço razoável, senão um alto custo para que se arrisque uma vaga. Ademais as leituras em nada atestam minha capacidade em sala de aula. Gabaritar a prova não garantirá que terei uma boa relação com meus pares e/ou com meus educandos. Acrescente-se que a bibliografia, às vezes sugerida, pode ser ‘viciada’ ou no mínimo tendenciosa. Noutras palavras, significará que eu e todos os outros candidatos deveremos apreender o que estará querendo a banca examinadora com as perguntas que constarão da prova.


O que os autores pedagógicos intentam com suas publicações? E quando uma organização opta por este e não aquele autor, o que significará essa atitude? Quantos educadores ponderam o que leram durante o período preparatório pré-concurso e reconsideram depois, já atuando? E quantos destes problematizam as leituras pedagógicas? O que os pedagogos dizem dessa ‘chuva’ de publicações como se a educação fosse qualquer coisa? O que explicaria nosso frisson pelos autores estrangeiros em detrimento dos nacionais? Agora, acima de tudo, se lemos tanto, por que a educação está como está? Por que temos a sensação de os alunos de hoje andam aprendendo menos que ontem?
Ainda sonho com o dia em que bastará dizer o que penso sobre o mundo, sobre a arte, sobre a poesia, sobre estar vivo para poder compartilhar com outras pessoas e, assim, chamarmo-nos, concomitantemente, educador/educando e vice-versa.
Por que preciso parar de ler “O caçador de pipas” e ler o ECA; isso me tornará mais humano, mais compreensivo e compassivo para com os demais?


Sempre que busco conteúdo que devo estudar para um concurso, imprimo-o e lembro do Schopenhauer. Ele dizia que “quando lemos, outra pessoa pensa por nós”. E acrescentava que a leitura gradativamente ia tirando-nos a capacidade de pensar. E pode até ser duro, mas muitas vezes quando leio alguns teóricos da educação minha impressão se une com a do filósofo alemão: “leram até ficarem burros”
[3].

Paremos por aqui. Vamos retomar a audição de Lenine?







ILUSTRAÇÃO

Ilustração de Philip Reeve para “ISAAC NEWTON E SUA MAÇÔ, de Kjartan Poskitt, Cia das Letras, 2001.




[1] Parece chover no molhado comentar esse excelente músico, compositor e produtor. Então, apenas sugiro que se adquira o CD Na pressão. É muuuuiiiiiito bom.
[2] Respectivamente, o que citei foi publicado pela editoras Verus, Nova Fronteira, Intrínseca, Companhia das Letras, EST/Sinodal e Contexto.
[3] In “A arte de escrever”, L&PM, pp. 127/128.

01 janeiro 2008

BOAS DE 2007

01 janeiro 2008 0
Levi Nauter


A gente não deve constituir-se num enigma apenas para os outros, mas também para si mesmo. Sören Kierkegaard

Várias coisas boas aconteceram nesse ano. Claro que vou me restringir a cultura. Algumas coisas que fiz – sozinho ou com a Lu – foram gratificantes e confortadoras; recomendo-as.

AQUISIÇÕES MUSICAIS
O último (1) CD de Chico Buarque é simplesmente chover no molhado de tão bom que costuma ser. (2) Não me canso de ouvir a maravilhosa voz e os arranjos do seu maravilhoso CD de estréia que, pra variar, faz mais sucesso nos EUA e na Europa que aqui na sua terra (carioca da gema). Estou falando da excelente Céu – como disse num rodapé de outro texto: o disco é um céu afro-brasileiro.
Com muita alegria, encontrei o primeiro presente que dei ao amor da minha vida, a Lu. Meio sem querer, esbarrei no maravilhoso (3) CD ‘Sobre todas as coisas’, da Zizi Possi, que há muito estava fora de catálogo. Nesse ritmo, adquiri também o CD que serviu de trilha para o nosso primeiro beijo: (4) George Michael. Reler os encartes – antes enormes porque eram LPs – foi emocionante.
Agora possuo, com orgulho, os três discos daquela que, devo admitir, desafina ao vivo, mas encanta em estúdio: (5) Vanessa da Mata. (6) Jorge Benjor veio pra minha casa numa coletânea bem legal. (7) Caetano (em DVD) com o excelente show ‘Prenda Minha’ – velho mas bom. Falando em velho, ela sempre é demais: (8) Marisa Monte arrebenta duplamente, o CD de sambas está furado no meio de tanto que ouvimos. Os maravilhosos conterrâneos que nos deixam orgulhosos de ser gaúcho: (9) César Oliveira e Rogério Melo e o sempre bom (10) Pirisca – com o seu ‘Bem de bem’. Além do sempre manso DVD de Norah Jones.
Não podia deixar de fazer menção aos preciosos amigos que me abastecem com coisas boas – em todos os sentidos. Dois em especial. O gaudério pastor Guto, marido da doutora Camila. Com ele consegui algumas preciosidades: (11) Dave Matthews Band e os respeitados do (12) Buena Vista Social Club. O outro amigo, o estudioso Marco Aurélio, a quem carinhosamente chamo Charlie Brown, apresentou-me o Smoth Jazz. Que maravilha! Pelo menos uns cinco CDs. Além disso o seu gosto pela música instrumental, especialmente pela guitarra e o violão mostraram-me os super-excelentes violonistas Andy McKee, Don Ross e Antoine Dufour.

AQUISIÇÕES LITERÁRIAS
Minhas aquisições literárias precisam ser subdivididas. Há o que adquiri comprando e o que adquiri lendo. O que não comprei apreendi pela bondade de alguns amigos leitores que me emprestaram obras lidas. Guto e Camila me permitiram “comer” as palavras de Sören Kierkegaard. Ane me fez perceber que já não gosto de Max Lucado como antes, ele é bastante repetitivo no conteúdo e não apresenta nenhum contraponto ao que chamo de norte-americanismo. Em contrapartida, estou adorando Zusak. A Dra. Karin apresentou-me Mathew Fox, além de ratificar meu gosto pelos excelentes Rubem Alves, Leonardo Boff e Paul Tournier.
Outras descobertas literárias emprestadas vêm da elegante biblioteca municipal da cidade nova na qual estou morando: Nova Santa Rita. É pequena, aconchegante, com atendimento praticamente personalizado e com livros que ainda cheiram a novos. Nela encontrei boa parte da obra do maravilhoso Ítalo Calvino, além dos sempre recomendados Garcia Márquez e Guimarães Rosa.
Quanto às aquisições, lembro-me apenas da última: ‘A mensagem secreta de Jesus’, de Brian D. McLaren. Um livro que me surpreendeu e que merece uma resenha no devido tempo.

Em 2008 todas as minhas aquisições vão ser restringidas devido ao gasto que estamos tendo para realizarmos o sonho da casa própria. Ficarei na espreita de empréstimos (he, he, he, he). Amigos, se toquem!!!

RETRO 2007

Levi Nauter


As cidades, como os sonhos, são construídas por desejos e medos, ainda que o fio condutor de seu discurso seja secreto, que as suas regras sejam absurdas, as suas perspectivas enganosas, e que todas as coisas escondam uma outra coisa. Ítalo Calvino


Há um ano escrevi:

“Eu espero continuar brigando com quem quer simplesmente aproveitar as situações do dia-a-dia para tirar proveito próprio. Estou farto disso. Também não pretendo ajudar quem tem mais a dar do que receber. Darei oferta aos que realmente carecerem e não aos que nos amedrontam mostrando um mapa do inferno ou as maldições por eu ser “canguinha” ou, ainda, aos que intimam colocando no meu colo um santinho, um incenso, uma caneta ou algo assim. Chega!”

Incrivelmente, continuo com a mesma opinião, com poucas diferenças e uma constatação um tanto desesperadora: o mundo é dos vivos.

Embora eu não seja tão midiático assim, não consegui resistir aos apelos e resolvi escrever minhas retrospectivas. Elas pouco têm de pretensão, querem apenas ser registradas para deleite próprio. Afinal, esse tipo de programa (em geral sob o título Retrospectiva 2007) só interessa a quem apresenta. Ando com um hiato em meus escritos. Posso, guardadas algumas proporções, me unir à Clarisse Lispector (sempre espetacular): “Escrevo porque sou desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias.” [in A HORA DA ESTRELA]. Eu também estou de saco cheio. Menos mal que muito do que sonhei ou sonhamos (eu e a Lu) deu certo. A conclusão mais drástica desse ano é que, no geral, as pessoas querem levar vantagem em tudo. Chego a essa ponderação por tudo que vivi ao longo do ano.
Nesse ano terminei um bom período de psicanálise. A Dra. Karin Wondracek[1] fez o que pôde para eu me tornar mais criativo (penso que nem tudo está perdido). Foi um dos poucos momentos em que não me senti usurpado.
Minha relação com a Lu completou doze anos; ela entrou para os últimos cinco anos na casa dos trinta e eu cheguei à idade de Cristo. Minha valorosa mulher trabalhou bastante numa jornada de sessenta horas semanais. Oh, fibra! A Lu é meu braço forte.
Encontrei, cara a cara, alguns dos poucos amigos que merecem esse título. Vê-los foi me conhecer um pouco mais. São aquelas pessoas que não julgam, conversam, acrescentam, não ficam ‘chorando as pitangas’. Com esses poucos amigos a gente não emburrece, aproveita belos momentos de estar vivo.
Em contrapartida, briguei com outros que estavam mais para colega que para amigo. Não suporto autoritarismo, fatalismo, arrogância, falta de humildade, falta de diálogo. Por isso, ‘quebrei os pratos’. Ah, faria tudo de novo. Vá mandar nos capangas não em mim. Não sou empregado passivo, sou servidor. Alguns que conheço tenho até pena de suas mulheres.

A boa-nova desse ano é a efetivação do sonho da casa própria. Finalmente, depois de doze anos, conseguimos dar o pontapé inicial e quase acabado do nosso ninho. Nunca gastei tanto dinheiro na vida. Demoramos anos para juntar e em meses quase que vai tudo. Aí foi onde mais vi ‘atravessadores’. Cada um queria tirar um pouquinho. Que tristeza! Minha leiguice quase me fez sucumbir, isso só não ocorreu porque não somos bestas de ninguém. Estamos sofrendo para lidar com a ansiedade, aprendendo a negociar, a pedir descontos, a rogar por mais prazos. Nunca as previsões do tempo tiveram tanta importância nas nossas vidas. Foi um bom aprendizado notar pessoas considerando rápido aquilo que achei que demorou bastante.
Nesse ano aumentei minha carga-horária na docência. Sofri na tentativa de preparar aulas mais interessantes aos alunos. O feedback foi além das minhas expectativas.
Li muito, adquiri livros, CDs, DVDs. Comprei uma bicicleta (com a qual pouco andei, é verdade). Conversei com muitas pessoas, conheci um senhor de esquerda – agora, justificadamente, decepcionado. Ele foi duas vezes à Alemanha Oriental. Outros bate-papos teriam sido melhores se não tivessem ocorridos. Como ainda há quem tenha um bom discurso e uma repudiante prática. Como é fácil falar mais e fazer menos. É triste ouvir mais porcaria que sabedoria da boca de educadores. Conversei com uma pessoa extremamente preconceituosa e como foi ruim ter que – para ser coerente – ‘brigar’ com ela.
Estou numa ‘casa de passagem’. Morando enquanto a minha está sendo construída. Tenho convivido com coisas que não gosto: música, pra mim, de péssima qualidade; cachorros, visão de mundo completamente diferente da minha. É um outro aprendizado, bem difícil. Minha admiração pela cidade continua, agora mais crítico, mais ponderado. Não menos admirado.

Minhas aspirações para 2008 são:
A conclusão da nova casa, esperada e sonhada por doze anos (é ruim ser proletário). Desejo continuar me aperfeiçoando tanto na leitura quanto na profissão, se possível partindo para um vôo mais alto. Mas nada, absolutamente nada supera o sonho da paternidade. A maior emoão da minha vida será um resultado positivo de exame de gravidez com a mulher que amo. Até um quarto está sendo construído com esse fim.
Que venha 2008!

[1] Autora de algumas obras que recomendo com entusiasmo. Dentre elas, o último lançamento da editora Ultimato, Caminhos da Graça.

15 dezembro 2007

estamos quase

15 dezembro 2007 0

Levi Nauter








Estamos suando a camisa, tendo bastante dores de cabeça. Mas o sonho está saindo. São dores de parto: doem no início, dão muito prazer depois.






21 outubro 2007

agora entendo

21 outubro 2007 1

Levi Nauter





Não suporto mais a política-partidária. Estou cônscio do mundo político, das implicações políticas de nossas ações e relações interpessoais. Mas também estou ciente do que é conviver com políticos de carteirinha, os filiados a algum partido. E, por incrível que pareça, já fui cortejado por alguns. Resisti, não cedi. Não me arrependo.
Lembro-me de vários momentos em que, direta ou indiretamente, fui persuadido a também persuadir ou induzir o outro a fazer o que "alguém" queria. Numa dessas ocasiões fui tentar convencer um grupo de adultos sobre a importância da educação.
– A educação tem de estar em primeiro lugar. Precisamos investir numa quadra esportiva - sustentava sem muita convicção.
– A gente sabe disso, apenas gostaríamos que outras coisas fossem feitas antes.
Até concordava com os humildes cidadãos presentes naquela reunião. Contudo, havia "alguém" superior que me pressionava para um outro lado - o lado de quem estava no poder. Que fosse uma sala de aula, um professor a mais, melhorias na infra-estrutura da escola. O importante era a educação vencer. A educação, nos moldes formais, tinha de ser tudo.
No saldo das reuniões com os populares o asfalto era o rei. Não havia jeito de convencer que a educação poderia ser melhor que uma rua calçada.
– Faltou problematizar mais, diziam-me os superiores.
Agora entendo.

Estando em um novo endereço, numa nova cidade e tendo que caminhar 800 metros diários percebo 'direitinho' o que aqueles cidadãos tentavam dizer com todas as forças.
Era fácil dizer que uma quadra esportiva, uma sala de aula ou um professor a mais podiam ser tão úteis quanto uma rua asfaltada. Era fácil enquanto eu pisava no asfalto. Parecia-me simples propor "pirações" e ignorar a poeira nos móveis das casas dos alunos, bem como aquela poeira que inalavam no trajeto até a escola.


Mas agora entendo. Sei o significado de viver na torcida por um tempo bom, sem chuva. Também torço para que, durante o trajeto até a parada de ônibus, nenhum carro passe "a mil" me jogando água suja ou barro. Consigo compreender o que é um calçado sujo no centro asfaltado da cidade. Já aprendi a contextualizar a frase "que chuva desgraçada". Até noto quanta educação ainda falta para alguns motoristas.
Por outro lado, vejo certa beleza no atrito calçado-barro-água. Acho engraçada a orquestra 'sapônica' produzindo uma música ininteligível. Treino meu ouvido ao diferenciar pingos da chuva numa poça d'água e no chão de terra firme. Atrai-me, ainda, o ruído dos restos d´água escondidos nas folhas das acácias, que se 'desprendem' com o vento.


É possível notar sofrimento, esperança e beleza na rua onde - momentaneamente - moro.

05 outubro 2007

[mistério] - levi nauter

05 outubro 2007 1

Levi Nauter





Tenho preferido dizer da minha satisfação de estar vivendo exatamente onde estou neste exato momento, ou seja, num lugar provisório que possui cara de interior, jeitos de periferia e muito para se aprender sobre a vida.
Outro dia parei-me para rever o Acústico Marina Lima. Num certo momento, ela chamou a instigante Fernanda Porto para cantar e tocar com ela a música Charme do mundo. Apesar de a letra ser meio água com açucar, há um momento em que o trecho, digamos, me pegou: "tudo que eu quero / sério / é todo esse mistério". A partir daí, tive de desligar o vídeo devido a reflexão que teimou em me envolver. Vi-me nesta situação: estávamos (eu e a Lu) indo morar perto da nossa construção, num lugar 18 Km mais distante donde antes moramos por doze anos.
Há todo um mistério que precisa ser apreendido nessa nova empreitada. O primeiro deles é que, sendo humanos, aonde passamos vamos criando laços fraternos. É sempre difícil cortar alguns desses laços. E o cortar a que me refiro está mais para "esticar" do que "cortar". Na verdade não cortamos nada, apenas fomos para outra cidade. As conversas diárias de outrora deram lugar a visitas. Os rostos que víamos todos os dias mudaram. O asfalto pelo qual passávamos diariamente foi trocado por uma rua de chão batido. Os poucos minutos que eu demorava pra chegar na escola onde trabalho transformaram-se em duas horas. O barulho ensurdecedor dos carros foi trocado pelo canto dos pássaros, dos sapos, das ovelhas e de algumas crianças que estão aprendendo a falar. O meu entorno mudou; estou, momentaneamente, como que sem laços.
Outro mistério é a gente daqui. Prefiro o termo gente porque ele me soa como uma palavra capaz de abarcar o amplo significado e as implicações de ser humano, de estar vivo. Minha redondeza é feita de gente simples, com poucos sonhos. Com fala mansa, eles dizem-me "aqui é assim, sempre calmo", o que tenho comprovado na prática. Estava acostumado com filas pra tudo (banco, supermercado, lojas, ferragens etc) e aqui isso praticamente não existe. À espera de um ônibus, em pleno horário de pico, as pessoas aguardam-no batendo um bom papo. Meu primeiro dia de espera foi surpreendente:
– Não tem fila pro ônibus? Indaguei curioso.
– Não, quando o ônibus chega as pessoas que precisam dele vão se ajeitando. São vários itinerários nessa parada, então não tem fila. Onde o senhor quer ir? Explicou-me um senhor prestativo.
Foi uma bela surpresa. Num mundo de correrias, lá parece que o tempo dá um tempo.
Finalizo minha pequena reflexão falando de um outro mistério que me vem chamando a atenção. Os mistérios do mato. Quando chego do trabalho, à noitinha, caminho aproximadamente oitocentos metros até a casa provisória. Durante o percurso ouço ruídos que nunca tinha escutado na minha vida. Sempre vivi em cidade com pouca árvore, mato, verde. Cantos de pássaros que eu nunca tinha escutado; o vento soprando nas acácias; o barulho parecendo uma porta se abrindo nos taquarais; meus pés pisando as pedras que parecem querer fugir; a minha respiração ofegando. Em casa, por volta das 23h, o ruído longínquo passa a ser dos eventuais caminhões que cruzam a BR-386. O ronco dos motores são de diversos tipos. Minha mente gira.
Não posso deixar de mencionar ainda um outro ruído: o barulho de betoneiras, colher de pedreiro, serra, chinelos, pedras, árvores. Tudo novo pra mim. Tudo parte de um sonho acalentado por doze anos. É extremamente difícil realizar o sonho da casa própria. Com o suor do nosso trabalho, sem a ajuda de terceiros (a não ser o Todo-Poderoso), estamos, como diria Renato Teixeira, "tocando em frente". Tudo que queremos é todo esse mistério.
Agora posso cantar o belo samba da Marisa Monte (Universo ao me redor) - que temos furado de tanto ouvir: "eu durmo sereno e acordo com o canto dos passarinhos".
Outros mistérios virão.

30 setembro 2007

[casa de passagem] - levi nauter

30 setembro 2007 0
Levi Nauter
Daqui a pouco faremos uma semana de casa nova. Novo lugar para morar, novo endereço, novos ares, novos desafios. Nossas noites têm sido tranqüilizadoras: sem o costumeiro barulho dos cachorros (que não tínhamos), sem tiros, sem ouvir muitas conversas, sem termos que ouvir músicas forçadamente.
Estamos numa casa de passagem, no sentido de que nela ficaremos por no máximo cinco meses. Enquanto isso acompanhamos mais de perto a construção, digamos, da casa definitiva. Olhamos de perto e de longe. Conversamos com o construtor, fazemos escolhas, sugerimos, ouvimos, olhamos, olhamos. Voltamos para a nossa nova realidade. Nova realidade? Sim.
Vivemos uma nova realidade desde o dia 21 de setembro deste ano (2007). O novo município tem cara de interior: o ar nos parece mais puro, há mais verdes, a menos poluição de carros e menos poluição sonora. Afinal, o município é pequeno. O maior baque, pelo menos pra mim, está sendo ter de conviver sem muita tecnologia. Momentaneamente, não temos computador nem TVs modernas; deixamos nosso 'som' que tocava MP3 - junto com muitos outros aparelhos e produtos - na casa de um parente. Por assim dizermos, fomos com o mínimo para sobrevivermos. Mas não deixei os livros. Nem tanto porque vou lê-los todos, mais porque eles parecem me consolar. Os livros me consolam. Melhor é dizer que alguns me consolam; outros, me enraivecem apesar de não me desfazer deles pois representam a minha história-memória. Quando olho para os livros que possuo ou lembro de todos os que já li, observo a minha própria história, as mudanças de cosmovisão pelas quais passei no decorrer dos anos. Por isso os livros todos foram comigo para a nova casa.
Momentaneamente não estão comigo muitos CDs e DVDs que gosto. Essa opção por viver com o mínimo tem sido uma experiência cheia de mistérios, alguns bem dolorosos. Parece bem mais fácil viver sem mordomias e depois tê-las do que, tendo-as, perdê-las. Não é fácil pisar no chão batido, "comer pó" depois de ter morado anos numa rua asfaltada. Igualmente não é tarefa fácil trocar um som com aproximadamente 200 watts por um de 20. Mais ainda: não é estimulante ficar perto de pessoas que parecem não ter mais sonhos. Não ter muitas esperanças, ficar indignado com a situação cotidiana parece-me sempre saudável. Mas não ter sonhos e nenhuma esperança de mudança é o fim. Essa é a sensação que tenho quando converso ou observo algumas pessoas dessa nova cidade.
Minha grande luta tem sido travada comigo mesmo: não perder a capacidade de sonhar e de ter esperança. E um bom alento para isso é saber que estou com minha mulher num lugar provisório, até que a casa definitiva se efetive. Nesse ínterim, tento aproveitar o momento da melhor maneira possível, tentando me desestressar, lendo, estudando, ouvindo um pouco de música - música mecânica e a música dos muitos pássaros que existem por perto. É essa função toda que não me deixa parar de sonhar. Essa função é cercada de um mistério que me fascina.
Contudo, minha opção tem sido pela vida. Apesar de eu demorar duas horas (tanto para chegar no meu lugar de trabalho quanto para voltar dele) num entra e sai de ônibus, nada substitui o prazer de estar num lugar com aspectos de interior e que me permite ser mais eu.

20 setembro 2007

mudança - levi nauter

20 setembro 2007 2
Olá

A todos os amigos – distantes ou mais chegados – comunicamos que estamos nos mudando para o município de Nova Santa Rita (BR 386 em direção a Triunfo). Lá estamos construindo nossa nova casa e vamos cuidar de perto todas as etapas da construção que se iniciou entre o final de julho e início de agosto.

Após doze anos morando num mesmo lugar, novos ares nos esperam. Santa Rita tem um ar interiorano que sempre nos encantou. Enfrentaremos desafios enormes e estamos com todo o gás pra isso.

Em tempo oportuno contaremos mais detalhes. Algumas inevitáveis reflexões sobre toda essa mudança serão postadas nos blogs que mantenho:

1- LEVI NA INTERNET – www.levinainternet.blogspot.com

2- ANOTAÇÕES SOBRE UM CRISTIANISMO – www.anotacoessobreumcristianismo.blogspot.com

A partir de agora, minhas intervenções internéticas ficarão restritas a uma vez por semana. Continuem opinando e enviando seus mails, reponde-los-ei na medida do possível. Nosso telefone residencial momentaneamente não existirá.

Grande abraço a todos,

Levi Nauter & Luciane de Mira.

07 setembro 2007

a linguagem na prática

07 setembro 2007 0
Levi Nauter



Apesar de eu não me considerar um professor exemplar, estou nessa e tento dar o melhor que posso. Desde que me formei leio muita teoria tendo em vista os desafios impostos pelos educandos. Corro aos livros, às anotações, aos cadernos da faculdade e, não poucas vezes, ao e-mail de alguns dos meus mestres. A professora Dra. Luana Soares, minha célebre orientadora do TCC (sabe tudo de pós-modernidade literária, paródia e romance arturiano – além de ser grande pesquisadora da obra de Saramago) é uma dessas pessoas que me salva.
Quero refletir sobre o impacto entre a teoria e a prática, sobre o quanto ela é importante quando se efetiva. Pois, afinal, há uma imponente diferença entre ler teoria e internalizá-la, outra, ainda, é vivê-la. Até hoje li (e continuarei lendo) a respeito das teorias que versam sobre a aquisição da linguagem. Atuo na área da linguagem, embora muito mais voltado à produção textual
[1], e saber sobre o que dizem/pensam em relação à linguagem nunca será demais. Contudo, o peso teórico mesmo, em geral, está mais fadado e ser visto de soslaio em épocas de concursos públicos; antes disso, ficam para as tão sonhadas ‘horas de folga’. O grande desafio do professor/educador talvez esteja em aprimorar a sua epistemologia[2] tanto quanto o faz para dominar os conteúdos de seu(s) componente(s) curricular(es). Porem, esse assunto não é o objeto do que eu quero falar ou dizer.
Estou no meio de um fogo. I’m in the fire. Estou na luta por adquirir uma no língua. Acabo de iniciar estudos sobre a língua inglesa na Universidade onde me graduei. O primeiro dia de aula foi um susto; agora me sinto mais à vontade em meio ao caos inicial da sensação de ter que pensar numa língua e dizer noutra. Ameniza saber-me no mesmo nível dos demais colegas da sala (beginning). Também é um alívio e uma ajuda muito boa gostar de algumas músicas ‘made-make in english’. Como, que fique bem claro, não sou adepto da visão de mundo norte-americana
[3], tampouco considero a língua inglesa a mais perfeita que existe, com a qual se diz absolutamente tudo. Eu amo a minha língua materna. Penso no inglês como a língua de Shakespeare e como uma possível ferramenta de trabalho. E só.

Então, qual a razão deste texto? Simplesmente dizer que sou forçado a voltar à criança que tenho em mim e que, em muitos momentos, tento esconder. A criança não tem medo de arriscar, de errar. Ela fica fazendo ‘testes’ com as palavras, grita, ri, brinca com os múltiplos sons da boca. Não se importa com o que os outros vão pensar. Eu sou exatamente o oposto. Faço um tremendo esforço para não errar. A criança também não tem medo da correção. Não sei se ela entende como um ato de amor, sei que eu tenho receios – até porque com a idade que tenho será um ato de correção mesmo e não de amor. O espaço acadêmico, na minha opinião, é ou deveria ser um lugar propício à possibilidade do erro como um constante recomeço e aprofundamento. O poeta já dizia que “basta estar vivo para correr perigo”, ainda assim nessa sociedade parece que nos ocultam essa máxima.
Momentos antes do meu primeiro encontro com a professora, ficava imaginando-a (nem sabia se seria ela ou ele). Pensava nos seus materiais didáticos, nas propostas ‘ulbrescas’ tão alardeadas nas aulas da graduação. Igualmente imaginava comparações entre as aulas que eu teria e as que dou para meus alunos de quarta e oitava série. ‘Será que tudo o que estou pensando agora meus alunos pensam em relação a mim?’ – indagava-me. Em relação a mim, ainda não tenho respostas, o que é muito bom na perspectiva educacional da qual sou adepto, ou seja, uma pedagogia da pergunta. Já em relação as aulas de inglês, estou adorando. Dentre tantas razões, algumas de ordem bem pessoais, está que não estudamos na perspectiva falaciosa de sair traduzindo tudo o que encontramos pela frente que não seja português. Não, é um exercício de captação da idéia central. Sobretudo, respeita-se a autonomia do aluno incentivando o seu avanço. Até mesmo o trabalho em grupos – uma das minhas tantas dificuldades – tem-me sido surpreendente.
A maior dificuldade nas aulas de inglês tem sido eu mesmo. Vencer os medos, os receios, as desconfianças e arriscar-me mais, eis o desafio. Tenho sentido na pele exatamente aquilo que proponho aos meus alunos: que falem, digam, expressem... Nessas primeiras aulas de inglês o outro tem sido importante, pois é ele quem me permite interagir e aprender. Essa é mais uma retificação das minhas iniciantes leituras do filósofo Martin Buber e seu instigante Eu e tu
[4].
É possível que paralelamente as aulas haja um aprofundamento filosófico-educacional, o que seria o ápice. Não acham?


[1] Mais especificamente, a produção escrita como forma de preservar a memória e como instrumento para dizer do e dialogar com o mundo.
[2] BECKER, Fernando. Epistemologia do professor: o cotidiano da escola. 10.ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2002.
[3] Essencialmente retratada na cosmovisão das artes pensadas exclusivamente para a grande massa.
[4] BUBER, Martin. Eu e tu. São Paulo: Moraes, 1974.

02 setembro 2007

à mulher que eu amo

02 setembro 2007 0

Levi Nauter





Falar de uma pessoa especial é difícil. Mas vale o esforço. Hoje meu coração está saltitante. Estou comemorando o aniversário da pessoa que me faz feliz. Passei a semana pensando em como fazer essa homenagem, em como dizer o que gostaria de dizer – sabendo, antecipadamente, que pouco vou expressar do que sinto. Há sentimentos que, trazidos à tona, são apenas sombra do que sentimos. Vale a tentativa.
Como somos apaixonados por música, meu recurso está definido.
Com quinze anos de convivência não tenho pudores para dizer que a amo. “É sobre-humano amar cê sabe muito bem/é sobre-humano amar, sentir, doer, gozar, ser feliz...”
[1] No início há receios de se dizer que ama; com o passar do tempo, o tal amor vai aflorando até que dizemos, sem medo, “vermelho são seus beijos/que meigos são seus olhos”[2]. Lu, és minha menina bonita, menina bonita, ai[3].
É maravilhoso estar contigo, Lu. Fico com a cabeça cheia de idéias
[4]. Como diria Lenine, é preciso paciência. São tantos os sonhos, as batalhas, os risos e os choros pelos quais temos passado. Haja paciência! [5]


Tenho aprendido muito nessa caminhada contigo. Admiro a tua garra, a tua obstinação por um foco. És os meus pés no chão; graças a isso, posso dar altos vôos sem preocupação. És um presente na minha vida, “és manjar de reis/dos mais finos canapés/mas agora é minha vez de te fazer mil cafunés”[6].
Não vejo a hora de podermos, juntos, rumarmos ao nosso novo ninho, onde viveremos o restante das nossas estações de existência. Muito mais histórias vão brotar, mais flores, mais coloridos, mais nós. Lá, mais seguidamente veremos beija-flor
[7].


Como podes ver, faltam-me as palavras. Prefiro encerrar com dois ícones das músicas que escutamos juntos:


Tom Zé


“...Menina a felicidade
É cheia de lata, é cheia de graça
É cheia de pano, é cheia de peno
É cheia de sino, é cheia de sono
É cheia de ano, é cheia de eno
É cheia de hino, é cheia de ono
É cheia de an, É cheia de en
É cheia de in, É cheia de on”
[8]


E esta, cantada pelo inconfundível Chico:


“De que calada maneira
Você chega assim sorrindo
Como se fosse a primavera
Eu morrendo
E de que modo sutil
Me derramou na camisa
Todas as flores de abril
Que lhe disse que eu era
Riso sempre e nunca pranto
Como se fosse a primavera
Não sou tanto
No entanto, que espiritual
Você me dar uma rosa
Do seu rosal principal”
[9]



Lu, eu te amo!
Tu és a demonstração da graça divina sobre a minha vida.
Parabéns pelo teu dia.








[1] Trecho de ‘Mais simples’, música do excelente professor-compositor-estudioso José Miguel Wisnik.
[2] Trecho de ‘Vermelho’, letra e música de Vanessa da Mata.
[3] Paráfrase de parte da letra da bela ‘Malemolência’, da maravilhosa Céu (o disco é um céu afro-brasileiro).
[4] Referência a uma Linda música do grupo Mundo Livre S/A, CD Por Pouco.
[5] Paciência faz parte do CD ‘Na pressão’.
[6] Manjar de Reis é uma composição de Jorge Mautner e Nelson Jacobina. Está no ótimo CD “Eu não peço desculplas” – de Mautner e Caetano.
[7] Há uma linda música homônima de Flávio Venturini e Ronaldo Bastos, que inclusive nomeia o CD: Beija-flor.
[8] Lindíssima música ‘Menina, amanhã de manhã’, do Tom Zé, cantada pela lindíssima voz de Mônica Salmaso – CD Iaiá.
[9] ‘Como se fosse a primavera’ é uma música de Pablo Milanez e Nicolás Guillén; está no imperdível CD Chico ao vivo, show As Cidades.

21 agosto 2007

A DIFÍCIL [e maravilhosa] ARTE DE ESCOLHER 2

21 agosto 2007 0
Levi Nauter




Não sou de indicar filmes. Não sou o que se possa chamar de cinéfilo. Contudo, por que furtar-me de dizer o que gostei? Por que não sugerir filmes nem tão cabeças como As invasões bárbaras ou algum do Godar?
É o que vou me permitir.
Neste final de semana, assisti, por duas vezes, ao filme O amor não tira férias – com as lindas Cameron Diaz, Kate Winslet, além de Jack Black e Jude Law (este, conforme a Lu, também lindo). Escrito e dirigido por Nancy Meyers, distribuído pela Universal, o filme é ótimo para quem está vivendo o que eu estou vivendo: construção de uma casa.

Para não ficar no reducionismo sempre nefasto a uma obra de arte, afirmo que há mais no filme. Destaco, por exemplo, uma pequeníssima amostra de como é feita a trilha sonora para um filme; temos, na personagem de Diaz, um modelo de estresse pelo trabalho – algo que a meu ver não vale a pena. Há o campo, digamos, amoroso: a personagem de Black tem uma ‘p’ sorte, um feio que consegue uma linda (talvez o meu caso). Aprofundando as questões humanas, o romance de Diaz e Law cativou-me. As filhas são duas crianças lindinhas (que vontade de brincar com elas). Há uma discussão quase secundária em torno de o quanto o mercado valoriza as pessoas a partir de uma certa idade.
Em que pese a temática mais nerd, gostei mesmo das duas casas. A de Los Angeles é cheia de tecnologia e, a meu ver, pouco aconchegante. Há boas idéias sobre jardim, sobre aberturas, cores. A segunda, no entanto, possui mais aconchego. É pequena, com ares mais interioranos; funcional. Em ambas o lugar, o entorno tinha tudo a ver. Sempre me pareceu, tanto vendo o filme quanto construindo, que a vizinhança também faz a nossa casa. Um vizinho caprichoso, por exemplo, nos instiga. A paisagem da segunda casa, Londres, é de uma beleza quase indescritível; a neve dava um charme todo especial.
Olhei duas vezes o filme.

Não posso deixar de destacar a trilha sonora. Com um amigo músico (e dos bons) tenho descoberto o ‘smooth jazz’. Pois no filme encontramos músicas dessa verve. Uma beleza. O excelente James Taylor dá uma canja. As músicas complementam o charme dos artistas bonitos, aliados a uma bela paisagem que vai sendo desnudada e enchendo a cabeça do espectador de idéias.

A mim falta só o dinheiro.
Fica a dica.

31 julho 2007

A DIFÍCIL [e maravilhosa] ARTE DE ESCOLHER

31 julho 2007 0
Levi Nauter


Sempre tive dificuldades em tomar decisões, em fazer escolhas. É sempre um risco essa tarefa. O melhor seria viver uma vida mais tranqüila, mais amena. No entanto, a vida é uma escolha. Ao menos parece-me.
Nesse final de semana fiquei enrrascado. Entrei em pelo menos três boas livrarias de Porto Alegre.
Nelas, tive dificuldades para escolher o que comprar, como ter o melhor preço, ter um livro valioso. Havia livros por toda a parte. Era quase possível tropeçar no objeto de meu desejo. Folhei vários, cheirei outros; senti o ventinho que faz ao folharmos todas as páginas num só ato. O que levar? Mas, com esse preço, será que não compro algo melhor? e por ai fui...
A mulher que roubava livros, de Zusak, será uma boa? E se adquirisse 101 dias em Bagdá, da Seierstad? E os meus alunos? Que obra posso comprar para melhor me sair nas aulas? Não tive respostas. E ao meu lado, como que me beliscando, Llosa, Márquez, Saramago, Borges, Huxley, Betancur, Gaarder. Também tinham os cristãos mais clássicos, aqueles que escrevem tudo o que a gente já sabe. Havia os auto-ajuda que, apesar de também sabermos do que tratam, faz-nos, às vezes, pensar: e se fosse verdade? Encontrei os cristãos que andam me atraindo mais ultimamente: o Steven, com o seu A espiritualidade na prática; o sempre bom Gondim, com O que os evangélicos [não] falam. Vi, mas não compraria no estágio em que estou, os pretendentes a baluartes da verdade, Charles Colson e Nancy Pearcey (ah, se essa gente protestasse contra seus atuais governantes).
Fiquei balançado com os filósofos Heidegger e Martin Buber, entre tantos outros.
O que fiz? Não comprei livro.
Apelei para a música, pensando que seria mais fácil. Ledo engano.
Encontrei muitos dos artistas que gosto, dos que têm alma, letra, cabeça, estudo, enfim, prestam. Não foi fácil escolher entre as maravilhosas Mônica Salmaso, Teresa Cristina, Rita Ribeiro, Céu, Zélia Duncan, Dona Ivone Lara, Olivia Hime, Olivia Byington, Bebel Gilberto, o Guinga, Zé Renato, Paulo Moura, Yamandú. Foi difícil.
Para terminar, acabei escolhendo a gata, a linda, a morena com a cor e o cabelo do Brasil: Vanessa da Mata. O CD Sim continua com a pesquisa de sons vocálicos do Essa boneca tem manual. Depois da Lu, a voz que mais ouço é a dela. Disse sim à Vanessa. Que voz dessa mulher!
Ouçam, vale a pena.
Estou cativado pela música Pirraça, dela e de Kassin. As fotos do conterrâneo Gringo Cardia, mais uma vez, como era de se esperar, ficaram lindas. Que arte!!!
Beijos,
vou ouvir música.
 
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