08 abril 2006

PAULO FREIRE E A CORRUPÇÃO

08 abril 2006 0
Se eu fosse falar sobre essa safadeza que anda acontecendo no país certamente seria excomungado por alguns. Por isso, prefiro que o imortal Paulo Freire diga. Leiamos:
Há algo, porém, que me assusta hoje, e quanto mais me assusta mais me move a falar, mais que falar, a gritar, ao expressar minha preocupação. Me assusta que o desencanto de milhões de brasileiros e de brasileiras, provocado pelo cinismo, pela desfaçatez, pela democratização da sem-vergonhice entre nós, pela impunidade que acoberta tudo, que deixa sempre para amanhã a punição necessária que jamais se realiza, termine por levá-los à defesa da ditadura que emergiria da democracia afogada nas águas da corrupção. [Paulo Freire]
E gora, o que dirão os freireanos que se calam diante da corrupção?

11 fevereiro 2006

ANTES E DEPOIS

11 fevereiro 2006 1
Levi Nauter, em 10-02-06

Houve um tempo em que eu corria
conseguia fugir de qualquer cachorro
era o guru dos mais fracos
quem não gostasse que fugia

Uma vez sorria muito mais que agora
todos para mim eram dentistas
não sabia que sorrisos podem ser falsos
fui mais feliz que agora

Hoje digo e esqueço
passo pelos outros e não lembro o nome
alguns deixam-me com vergonha, fazem "escraxos"
facilmente me aborreço
Antes amava de verdade
gostava de ser gentleman
era de dar golpes baixos
nada mais passa de vaidade
Antes tinha lugar pra tudo, né
tudo mudou, de repente
nada mais faço
a não ser mijar no pé
Antes...
Agora...
Ih, esqueci!!!

ODE A UM PAI [Pai X pai]

Levi Nauter, 27-01-06
Estou vendo um pai
vem atrás de mim
com braços fortes
de quem trabalha com ferro; ar arrogante. Mas esse
eu não quero!
Estou vendo outro Pai
vem a minha frente.
Tem braços fortes e fracos; é alado.
Não consigo ver Seu rosto, brilha muito.
Esse eu quero!
Aquele, nem vi passar por mim.
Esse está do meu lado.
Os dias passam depressa, nem os noto.
Sinto como se voasse com o tempo.
Ele me leva...

15 janeiro 2006

MEU CORAÇÃO ESTÁ PRETO. A MORTE CHEGOU

15 janeiro 2006 4
Levi Nauter

A sexta-feira 13 nunca mais será a mesma para mim. O dia 13 de janeiro sempre será lembrado. Nesse dia a morte finalmente chegou, sem dó nem piedade. Roubou de mim[1] algo precioso. Tirou parte do meu coração. Tirou quem defendeu a vida até não agüentar mais viver. Pareceu um golpe baixo. Fê-la sofrer por querer bem, por amar. Com um suspiro que parecia dizer “fiz o que pude” ela nos deu tchau de mãos dadas com a morte. A morte não tem sentimentos. Danada! Por que levar minha mãe agora? Louca! Por que não brigou com alguém do teu tamanho?

Meu coração está preto. Sei que ele é feito de sangue, é vermelho. Mas, por hora, ele está preto. Porque para mim, por enquanto, está noite. Porque a ajudei colocar a urna mortuária num lugar escuro. Porque estou escrevendo no escuro. Porque tenho um aperto no meu coração. Porque há, agora, um abismo de separação entre eu e ela; uma saudade que parece escura, distante, tênue. Parece que eu estava com a mão no ombro da minha razão de ter vindo ao mundo – a mãe – e, de repente, a malvada morte veio e começou puxá-la para o lado oposto. Assim, minha mão foi descendo, passou pelo cotovelo, foi descendo, passou pela mão calejada, foi saindo, pegou forte nas juntas dos dedos, foi saindo, tocou as unhas, saiu. Fiz força para encontrar a mão dela – que parecia também querer encontrar a minha. Inútil força. A morte venceu. Apenas chorei. Como estou agora enquanto escrevo para alguém que nem sei que poderá ser.
Mas escondi um segredo da morte.

Agora estou vendo minha mãe de um outro ângulo. O ângulo divino. Ângulo do amor incondicional divino, ângulo de amor que ultrapassa o entendimento e chega a ser loucura para alguns. É muito melhor.
Lá vem ela. Forte, linda. Uma mulher sedutora, com voz firme. Está toda chique. Não vem vestindo um vestido qualquer. Vem com um modelito próprio, tirado da sua própria imaginação. Vem com uma pasta enorme. Nela há uma porção de modelos desenhados. Um modelo de roupa que fez pra mim há muito tempo atrás. Outro modelo que fez para o meu irmão. “Esse eu fiz pro Jones”, diz ela contente acrescentando que o Misael já era mais moderno e usava roupas feitas na indústria. Algumas mulheres parecem ter gostado da idéia. A mãe disse que elas não viram nada. Passou a mostrar os vestidos que fez para as minhas queridas irmãs: Lílian e Miriã. “Minhas filhas ficam lindas com as roupas que eu faço”, disse orgulhosa. Só imaginamos, disseram.
Há um livreto de receitas também com ela. E já chegou avisando que todos nós adorávamos o seu pudim de leite condensado. Uma coisa ela disse que talvez não fizesse, para evitar caras feias: doce de laranja azeda.
Numa certa altura, largou tudo o que tinha e foi, tesa, num caminho todo branco como neve. Creio que levava a firmeza e a determinação com que sempre lidou nesse mundo terreal. As mãos e as pernas fracas daqui nem pareciam ser as mesmas. Andava como quem diz “cumpri minha missão: criei meus filhos, trabalhei dignamente e amei um homem”. Não titubeava, sentia-se orgulhosa de tudo que fizera.

Pois é exatamente essa determinação que eu quero, que eu busco. A mesma firmeza, a mesma ternura, a mesma paixão.

Parece que ela me notou.

Mãe, que saudade!
Que vontade de fazer como os bebês: agarrar-te e não desgrudar
Beijar-te, sentir o teu coração
Passar a mão no teu cabelo
Relembrar as vezes que dormia contigo com medo de fantasmas

Queria ser menor que você outra vez
Pra que teu queixo encostasse na minha cabeça e
Assim tivesse a sensação de que nada seria mais seguro que o teu corpo

Tua voz pra mim era também como a voz de um trovão gentil
Acho que aprendi a costurar só pra ficar mais parecido contigo
Acho que disse tanta ‘bobagem’ só pra poder rir contigo

Como temos a mesma crença,
Vai fazendo uma roupa pra mim.

Um dia estarei perto de ti,
Vamos sentar em algum lugar aconchegante para conversar.

Até breve !!!




[1] E creio que falo pelos meus irmãos, também enlutados.

12 janeiro 2006

Meus dias têm sido exatamente o oposto dos dias de Brasília

12 janeiro 2006 0
LEVI NAUTER
Depois de algum tempo, estou por aqui postando. Felizmente em férias! Estou, contudo, estudando bastante. Fazendo um intensivo na tentativa de me formar em 2006/1. Meus dias têm sido exatamente o oposto dos dias de Brasília. Tenho aulas das 15h às 22h30m. Que tal?
Um dia saio dessa vida e vou para um lugar no qual se trabalhe bem menos e ganhe bem mais.
Por enquanto sigo aqui lendo conteúdos pedagógicos, mesclando com Quando Nietzsche chorou. Mas não me desamparem, continuemos interagindo.

30 dezembro 2005

QUE TENHAMOS MUITAS DIFICULDADES EM 2006

30 dezembro 2005 0
Levi Nauter

Eu vou estar torcendo para que todas as pessoas que conheço - tanto as que quero bem quanto as que ainda devo buscar esse bem querer - tenham um ano de 2006 cheio de dificuldades. Incluo-me nessa também.
A razão é simples. Não será possível um ano cheio de surpresas, de avanços, de vitórias sem os seus antônimos. Temos vitória depois de uma luta, avançamos na medida em que ultrapassamos nossos medos. E por aí se vai...
O novo ano promete. Ouviremos os grandes treinamentos de retórica. Escutaremos um caminhão de promessas. Vão-nos convencer de que, outra vez, a esperança deverá vencer o medo. Ouçamos, pois! Mas não nos iludamos, mudanças significativas não virão assim no más. Vamos tentar lembrar das famigeradas cabeças nas quais votaremos. Ou depois não reclamemos por termos votado em branco, outra faceta da democracia.
Continuarei tentando ser freireano. Continuarei buscando arduamente conciliar discurso e prática. Tentarei lembrar que Deus me criou com duas orelhas e uma boca e isso tem um significado.
Mas, sobretudo, quero ver Deus nas pequenas coisas (e excepcionalmente nas grandes também). Vou apreciar a beleza dos pequenos detalhes da vida que, de tanto sofrer alterações por mãos humanas, vão exigir outra façanha: a criticização do mundo.
Quero que todos se ralem. Até eu. Só assim, no próximo final de ano, vou poder fazer um bom balanço e não precisarei assistir a esses "programecos" cujos títulos são sempre os pobres 'RETROSPECTIVA 2005'.
Que venha 2006.
Cá estou.

22 dezembro 2005

FELIZ NATAL

22 dezembro 2005 0
Levi Nauter

Espero que neste natal esqueçamos os presentes, sejamos menos formais, saibamos dizer mais o que pensamos. que possamos refletir no sentido real natalino.
Chega de papai noel vestido com roupa de inverno em pleno verão. E chega do Jesus Cristo reduzido a Jesus Menino e, sobretudo, só lembrado em dezembro. O papel de Cristo vai além de um mês. Vai além do capital, além do bem e do mal.
Papai noel é a desculpa que inventamos para pedir, ganhar e dar presentes. É o momento em que escrevemos bilhetes para as pessoas chamadas amigas secretas. O secreto nem sempre funciona bem. O ideal seria lidarmos com as coisas à luz.
Escrevamos bilhetes sempre. Deixemos claras nossas opções sócio-políticas e intelectuais. Vivamos o hoje.
Mas, porque ainda somos formais,
FELIZ NATAL !!!

17 dezembro 2005

Ainda vou ser deputado

17 dezembro 2005 0
Levi Nauter
Ainda vou ser deputado. Não me importarei com trabalhar extraordinariamente. Vou amorcegar ao longo do ano. No final, proponho trabalhar "duro". Às pessoas direi que isso mesmo, vida de parlamentar não é fácil. É preciso ter estudo, ser esperto. Ah, tem de saber trabalhar com a palavra. Toda e qualquer fala precisa de um 'viés' político, o povo tem que ver comoção em minhas palavras. Não tomar muita água poderá dar o mesmo efeito. Quero apertar a mão de todos e todas. Elas gostam mais, ficam frenetizadas com minha barba por fazer. Dizem que sou meio charmoso. Assim, ganho votos, 28 mil por mês. Assim garanto meu sítio, minha cobertura. Lá de cima vejo todos pequenos, todos os que me sustentam. Tenho pena deles. Mas minha mãe (sábia mãe) sempre dizia: os maiores comem os menores.
Preciso me preparar para daqui a pouco comer uma galinha enfarofada para sair bem na foto. Quero pegar uma coxa, colocá-la na boca, dar um sorriso e clique, tá pronta a foto.
Quando for deputado quero parabenizar esses espertos que ganham bem sem fazer nada. Vou dizer solenemente: - muito prazer...
Depois é só abrir uma conta e deixar rolar, como água, 20 mil por mês. Mais a convocação extraordinária né. Afinal, ninguém trabalha de graça.

06 dezembro 2005

Prefiro 12 mil a 300 reais

06 dezembro 2005 2
Levi Nauter


Sorri com tranqüilidade
Quando alguém te calunia.
Quem sabe o que não seria
Se ele dissesse a verdade...
Mário Quintana


Foi lamentável ouvir de um representante do povo que ganha mal, apesar de receber em dia. Num país onde milhares, a maioria, ganha em média o salário mínimo ouvir de um parlamentar que sua remuneração é pouca é, no mínimo, triste. Nem parece que são eles quem aprovam esse salário de miséria – e que, às vezes nem é pago em dia.
Vamos combinar: 12 mil reais não é pouco. Seu Zé que tenha a ‘santa’ paciência!
Não dá mais para relevar. Chega de ter que apoiar coisas inaceitáveis, não éticas, imorais ou injustas, falaciosas em alguns momentos, sofismáticos noutros. De minha parte, cansei. Estou farto de viver ouvindo sobre o poder. E acho, sinceramente, que o poder corrompe. Bem nos alertava Sófocles
[1] em sua famosa peça Antígona:
"Não se conhece verdadeiramente um homem, sua alma, sentimentos e intenções, senão quando ele administra o poder e executa as leis." (p. 12)

Prefiro a ignorância bela das gentetudes a ver engravatados (ou gente com o mesmo poder) arrogantes, com falsa modéstia divagando sobre pobreza, sobre fome. Como é fácil falar de fome quando não a temos. Não é difícil falar de terra quando temos um pedaço de chão. É fácil falar “de angicos a ausentes”
[2] quando falamos, pegamos nosso cachê ou não, mas, sobretudo, voltamos a nossa cidade e continuamos publicando livros para uma certa elite aqui ou ali – mesmo sabendo que eles continuarão angicos e ausente.
Que exemplos nos dão quando não ensinam o respeito mútuo e, assim, vale bater no outro e – em nenhuma hipótese – deixa-se batido por outrem. O outro seria menos humano? O que é respeitar, conviver, cantar, almoçar ou jantar com as diferenças nesse ínterim?
Mas, como diria Vinicius de Moraes, ainda tenho “essa pequenina luz indecifrável a que às vezes os poetas dão o nome de esperança” (Moraes apud Alves, p. 67)
[3].
Sim, ainda tenho esperança.
Espero banir alguns nomes da política partidária – pelo voto, claro. Espero poder contribuir com a educação ao provocar a criticidade em meus alunos, quando lhes disser que poderão ler e escrever à vontade porque não darei nota. Espero poder rir com os desdentados sem o receio de ser ridículo, pois cansei de ficar perto de empiriquitados (as). Espero ser um profissional da educação que busca a excelência, não importando se isso será de esquerda ou de direita. Neste caminho vou querer melhorar financeiramente, mesmo que não ganhe os 12.

Continuarei político, todavia. Só deixarei de sê-lo quando morrer. Não será porque não tenho filiação que deixarei de fazer críticas ao que aí está – e ao que vier. Sei o meu lugar, sei aonde posso ir, sei dar a volta, consigo passar ao largo. Sei ser arrogante também. Sei aproveitar oportunidades, sei fazer falcatrua. Sei fazer prova e passar sem passar. Também vivo o paradoxo de ser educador e pseudoeducador freireano. Busco autonomia, embora paradoxalmente negue-a a outros. A única diferença é que não sou “malandro candidato a malandro federal” nem tenho “retrato na coluna social”[4]. E mais, não ganho 12.
O ano de 2006 poderá ser diferente. Ao eleitoral. Receberemos visitas ilustres. É assim mesmo: uns desprezam os valores, outros se contentam com os 12. É melhor que 300. por alguns meses irão nos abraçar, beijar, ligar. Até o celular, talvez, saberemos o número. Como num filme, alguns meses depois:
Que horror quando o celular não toca!
Ninguém está se lembrando de mim!
Ninguém precisa de mim!
[5]

Mas não adianta. Na pseudodemocracia que temos, na qual votar é uma obrigação, há quem
Tem um jeito manso que é so seu
Que rouba os meus sentidos
Viola os meus ouvidos
Com tantos segredos lindos e indecentes
Depois brinca comigo
Ri do meu umbigo
E me crava os dentes
[6]

E assim vamos vivendo de amor, diria Lupicínio Rodrigues. Devo ratificar, enfim, que ainda prefiro 12 a 300. Como nem tudo é perfeito, paro de escrever porque tenho que trabalhar para me sustentar.

NOTAS


[1] SÓFOCLES (496-406 a.C.). Antígona. Trad. Millôr Fernandes. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
[2] BRANDÃO, Carlos Rodrigues. De angicos a ausentes: quarenta anos de educação popular. Porto Alegre: MOVA-RS; CORAG, 2001. Obra-relato do Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos do RS.
[3] ALVES, Rubem. Se eu pudesse viver minha vida novamente. 6.ed. Organização de Raíssa Castro Oliveira. Campinas – SP: Verus Editora, 2004.
[4] Fragmentos da música Homenagem ao malandro, do grande Chico Buarque.
[5] Texto do Rubem Alves. Idem à nota 3.
[6] Fragmento da música O meu amor, de Chico Buarque.

05 dezembro 2005

Sin Permiso

05 dezembro 2005 1
Retirado do VIDANET
Todos os políticos, sobretudo os de esquerda, deveriam ter em letras gigantes, pendurado na parede, para não esquecer nunca, que está proibido, terminantemente proibido, pecar contra a esperança.
Eduardo Galeano,
em entrevista à revista catalã Sin Permiso.

27 novembro 2005

VOU VIAJAR

27 novembro 2005 2
Levi Nauter
Estou quase indo viajar. Não farei uma viagem dessas comuns. Vou sair de um lugar e ir para outro. A rotina me incomoda, esse negócio de ficar sempre no mesmo lugar não dá certo. Sem contar que eu não gosto de apenas discursar e não cumprir. O mundo já está cheio de gente assim - que diz e não faz - não precisa de mais um. Ser educador exige que gostemos de preservar as palavras - tanto no sentido da boniteza quanto no cumprir com ela.
Por isso vou espairecer. Quero ver outros lugares, outras pessoas, sonhar outros sonhos. Quero (re)organizar minha vida, planejar de novo. Quero pegar outro ônibus. Quero contribuir mais efetivamente. Poder discutir tete a tete, ser escutado ou bronqueado quando fizer jus. Quero ter algum dia de folga - porque acho bom para viver. Só trabalhar 24 horas por dia não nos deixa viver. Ao contrário, nos faz envelhecer mais depressa, nos tornamos mais chatos. Quero não fazer nada, me espreguiçar, bocejar, ouvir música, ler, escrever. Chutar o balde, a pedra. Dormir, dormir muito. Comer, beber.
Aos trinta e um anos, acho que já posso começar decidir o que quero.
2006, aguarde-me !!!

23 novembro 2005

Poesia # FINAL DE SEMANA

23 novembro 2005 1
Levi Nauter

Hoje despi-me de tudo
tirei a roupa burocrática
desvesti minha voz do politiquêz
e do politicamente correto

Fiquei pelado
optei por dizer palavrão
esqueci de falar pausadamente
quis correr, após passar o dia num balcão

Encontrei uma mulher
abracei-a, alisei-a
deixei correr meus dedos em alguns lugares
juntos
fomos à praia

Lá, dormimos
pisamos na areia
fizemos amor
o sono veio
a rede
eu
ela
nós
zzzzzzzzzz...

18 novembro 2005

CHUTEI A PEDRA E TIREI A UNHA ENCRAVADA

18 novembro 2005 0
Levi Nauter
Cresci sob um teto sossegado,
meu sonho era um pequenino sonho meu.
Na ciência dos cuidados fui treinado.
Agora, entre meu ser e o ser alheio
a linha de fronteira se rompeu.
Waly Salomão [in Algaravias, Editora 34, p. 21]
Já não aguentava mais. Caminhava, caminhava e desgraçadamente enxergava aquela maldita pedra no meio do caminho. Acho que nunca vou esquecê-la. Mas hoje tomei uma atitude. Puta merda, chutei a pedra. No início doeu o dedão do pé. Foi bom, descobri uma unha encravada. Deixei-a de molho n'água por alguns minutos e, pimba, foi-se.
Agora estou tendo tempo - uma vez que a pedra não atrapalhou mais meu caminho e, portanto, pude chegar em casa - de rir com as piadas contadas no Planalto. Incrivelmente Deputados, que ganham bem para bem intervirem nas questões legais, não sabiam dos prazos de início e/ou término de seus trabalhos nas comissões 'para lamentar'. Contudo, temos ainda de lutar para o fortalecimento da democracia e, nesse ínterim, deslizes irão ocorrer. Ao mesmo tempo teremos de sugerir ao Congresso Nacional que comece a visitar livrarias (essas megastores da vida) na busca de bons livros existentes no mercado que tratam dA importância do ato de ler.
Acho que esse povo começa a ser minha nova pedra. Já sem a unha encravada por não estarem exatamente no meu caminho, o que poderia eu fazer?

05 novembro 2005

O EXEMPLO DRUMMOND

05 novembro 2005 1
Levi Nauter

Tanto Drummond como seus companheiros do Modernismo nos dão uma lição: temos de ousar fazer coisas diferentes. Por minha vez, estou peleando contra as frustrações da vida. Por vezes penso que pouco há o que fazer; noutras, acho que tenho de continuar tentando. Enfim, fico com as duas opções: nalguns momentos fico triste, em outros busco a felicidade. Não é muito fácil. Talvez essa seja a razão de a felicidade ser uma constante e incansável busca.
Ainda assim, o exemplo Drummond me vem a mente ao lembrar que todos queriam divagar sobre assuntos politicamente corretos. De repente:
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
No meio do meu caminho ainda tem uma pedra. Penso que, como esse autor, nunca esquecerei esse acontecimento. Pois, no meio do meu caminho ainda tem uma pedra. Lá está ela. Não sei se chuto, não sei se passo ao largo.
Mas estou vendo-a,
no meio do caminho.

20 outubro 2005

ESTOU VENDO A MORTE

20 outubro 2005 5
Levi Nauter
"Em seu féretro com panejamentos de púrpura,
separada da realidade por oito torniquetes de cobre,
a Mamãe Grande estava então por demais embebida
e sua eternidade de formol para perceber
a magnitude de suagrandeza."
(García Marquez, in Os funerais da mamãe grande)
Não gostaria de ter que admitir. Mas ela está rondando meus entes queridos. Minha mãe está morrendo. Já não posso mais negar, queria que tudo não passasse de uma ilusão, gostaria de ver minha mãe gorda e saudável, forte e convincente, lúcida e guerreira. Ao contrário, vejo-a como uma caveira, não porque quero, é que assim ela está. Seu olhar é fundo, quando a abraço sinto os ossos escondidos por uma pele escura e judiada – pele recheada de hematomas, cicatrizes (aproximadamente quatro cirurgias de hérnias), feridas que insistem em contaminar em função de uma diabete quase implacável. São algumas pistas da morte que vem chegando. Agora, sob controle, lá estão os sinais das tais feridas que tanto foram coçadas.
Olho para ela e sinto-a como que querendo abraçar a dita cuja. Como se dissesse “venha, estou pronta para dormir o sono das sombras”. Há nela um olhar de morte, de desespero, de “me tirem desse mundo”. Ar de sofrimento que se esgota, de quem já apanhou que chega da vida mesclado por uns tapas do marido (aquele para quem ela se entregou, foi fiel, deu). Ar de quem, nalguns momentos, defendeu-me de apanhar nas vezes em que fiz ‘arte’, nas vezes em que tentei ser gente e meu pai não entendeu. O fio de luz com o qual eu apanhava parou, fortemente seguro pelas mãos da mãe. A mesma mão que fazia faxina para complementar a renda familiar. Também a mesma que ousou trazer gibi para os filhos lerem algo que não fosse a Bíblia. Igualmente a que trouxe uma televisão quando um desgraçado evangelho pregava a teologia do medo.
Sua voz anda embargada, sem forças. Não tem a mesma impetuosidade de outrora, quando gritava “vem pra dentro ou entrego vocês pro pai” ou ao dizer “é um diabo esse guri”. Ainda a mesma que amedrontava ao dizer “não vai te passar com as tuas irmãs”. Ah, voz. A idêntica que noutros tons deve ter sussurrado com meu pai e, puxa, a sinônima que o mandou-o embora ao saber que fora traída. Finalmente, a mesmíssima que foi abafada na tentativa de esconder choros devido aos sofrimentos psicológicos.
Pernas fracas. Elas estão entregues às traças, já não têm a mesma firmeza das vezes em que caiu comigo no colo sem que eu alcançasse o chão. E que colo bom era... Lembro-me dele quando nossa casa destelhou. O colo, o cobertor, um saco plástico e as rezas nos salvaram.
.......

23 setembro 2005

O QUE FAZER?

23 setembro 2005 0
"Escrevemos para denunciar o que dói".
Eduardo Galeano
O que nos resta fazer como educadores que prentendemos ser? Como pedir e tentar ensinar aos alunos a importância do respeito ao outro, o direito de o outro dizer o que pensa - ainda que discordemos? Como ensinamos democracia num país em que ela parece ser comprada? Como dizer "aluno, não é legal brigar" quando um deputado quase fura o outro? Ultimamente tenho ficado com vergonha desse parlamento. É claro que entendo a democracia como sendo um processo e que nele estamos longe. Contudo, imagino que nossos reperesentantes, sob nenhuma hipótese, deveriam assim se comportar. Tenho feito um esforço sobremaneira para continuar tendo esperança. Mas está difícil.

16 setembro 2005

A COISA MAIS LINDA DO MUNDO

16 setembro 2005 0
A coisa mais linda do mundo foi ter Roberto Jeferson na Câmara.
Era o único momento em que aquele lugar ficava cheio.
Eles estão certos: nós somos legais, pagamos bem aquele povo. Eles fazem um monte de coisas por nós, tipo nos desarmar. Além do mais, alguns senhores só saem de lá para se aposentar. Aqueles ínfimos 21.000,00 são suas únicas formas de ganha-pão. Coitadinhos.
Agora com a saída do Je, quem vai encantar? Quem fará aquela casa encher?

14 setembro 2005

MEUS GRILOS

14 setembro 2005 0
Levi Nauter

Minha casa é de madeira. Tem dias que ouço o belo barulho dos grilos – prefiro dizer que eles cantam. O problema é não agüentá-lo mais, após aproximadamente vinte minutos. O que era bom passa a ser ruim. Antes um som da natureza criada por Deus, de repente, um ensurdecedor ‘demoninho’ devido o barulho que faz.
Comecei a pensar no meu cotidiano. Sou cheio de grilos, de problemas interiores. Nalguns momentos acho isso legal pois cresço, supero-me, pareço imbatível. Se me descuido sou insuspeito, ando como quem não tem problemas, eretamente, olho pouco para os lados. Noutras ocasiões sinto-me derrotado, não avanço, milhões de coisas passam pela minha cabeça. Parece haver literalmente um grilo na minha mente. Tomo cafezinho, ligo o som (para ouvir alguma música ou alguma voz), olho televisão, rezo em pensamento – quando não de joelhos mesmo. Penso nas famigeradas frases de efeito algum, como “quem mexeu no meu queijo”
[1], “não faça tempestade em copo d’água”[2]. Choro, tento rir. Respiro fundo, confiro os batimentos cardíacos, torço para a hora passar. Suo, tomo água. Quando indagado sigo meu clichê: ‘tudo bem! E com você?’
Mas sabem o que é pior? O grilo não vai embora. Um dia bati na parede de casa devido a zoeira do bichinho. De nada adiantou, trinta segundos depois lá estava o cricrilar. Minha vida é assim e acho que não sou o único: meus grilos vêm e vão, um dia estou bem, no outro mais ou menos, em seguida, mal.
Por isso é que certas pessoas são importantes. Elas nos mostram o grilinho que o vemos como grilão. Dão-nos pistas para melhorias, perguntam para podermos responder muito mais a nós do que para elas. Existem outros que parecem ter o dom de apenas olhar, apenas fazer um gesto. Nada falam, mas tudo dizem. Ainda existem os duros na queda. São os que nunca estão satisfeitos, os desafiadores, os lançadores dos terríveis ‘por que isso, por que aquilo?’. Os mesmos que alfinetam ‘tá bom mas poderia ter ficado melhor’. Toda essa gente pode ser chata em algum momento, os grilos também o são. Acho que a vida seria sem graça com a ausência desse pessoal; os ‘moles’ me fazem ver que não sou tão ruim quanto pareço às vezes, os ‘durões’ me desafiam para o presente hoje e para o futuro. Ambos mostram minha gentetude
[3], mostram-me que só erro por ser humano, sou humano graças a eles.
Descobri, com um misto de alegria e tristeza, uma coisa: sou cricri.

NOTAS:


[1] Obra do Dr. Spencer Johnson da qual surgiu outras bem ao estilo made in USA. Ex.: “Quem mexeu no meu queijo?” para Jovens. Ah, a publicação é da Record.
[2] Segue a mesma linha do item 2. Obra de Richard Carlson, publicação da editora Rocco, o livro ganhou versões como Não faça tempestade em copo d’água (no amor), Não faça tempestade em copo d’água (no trabalho), Não faça tempestade em copo d’água (com a família), Não faça tempestade em copo d’água (para adolescentes), Não faça tempestade em copo d’água (para homens), Não faça tempestade em copo d’água (para mulheres). Viu como cansar.
[3] Expressão cunhada pelo quase imortal Paulo Freire.

09 setembro 2005

Brasil I love you

09 setembro 2005 0
Levi Nauter, 09-09-05
Eu amo o Brasil. Isso precisa ficar claro antes de alguns esquerdas considerarem que sou falso ou coisa que o valha. É exatamente por amar que não estou contente com ele. Se não amasse seria indiferente quanto aos acontecimentos atuais. Essa vergonha nacional - que não começou e tampouco terminará agora - exige que busquemos informações, leiamos jornais, revistas, assistamos televisão e troquemos impressões com outras pessoas. Também não pode ficar de fora uma busca bibliográfica da história, até para ratificarmos o reflexo de outros tempos no de agora.
Na minha vida particular, posso dizer que amo a Lu. Mas também tenho de confessar que, às vezes, nos estranhamos. E no amplo sentido da palavra. Por vezes não a conheço nem ela a mim. Então levamos algumas horas, quando não dias, para retomarmos o diálogo, (re)estabelecer a fraternidade, o bate-papo descontraído. Parece que, nos primeiros instantes, um de nós fica meio desconfiado, olha meio de soslaio. Mas, de repente, tudo fica bem, as coisas voltam ao normal e, suponho que pelo amor que nos sentimos, vamos esquecendo d'outrora e tocamnos o barco. Contudo, até chegar aí reivindicamos, protestamos, ficamos 'de bico', entre outras demonstrações. De uma coisa continuo tendo certeza: continuo amando em que pese minha discordância. Marisa Monte dá o clima (Amor I love you/Amor I love you/Amor I love you/Amor I love you).
Com o Brasil é a mesma coisa. Continuo amando-o. Todavia não posso aceitar essa coisa que anda acontecendo. Muitos trabalhadores sem aumento há um bom tempo, enquanto alguns assessores de deputado com a sorte de ter bons rendimentos. Nosso Presidente não fala efetivamente da crise, e, quando o faz, resvala em contradições quase imperdoáveis. Tenho a impressão de que temos, governando o país, o melhor que poderíamos ter. Ainda prefiro esse pensamento que engatinha para o social a ver governos sem o mínimo de preocupação com isso. O presidente da Câmara é uma calamidade, acho até que tem de sair. Mas quem irá assumir? Vai mudar radicalmente alguma coisa? Sinceramente penso que não.
Por amar esse país, acho que o Presidente deveria dar uma explicação mais convincente da situação. Por esse mesmo amor tento renovar minhas esperanças na tentativa de tirar o medo que ainda me ronda buscando tragar minha confiança na classe político-partidária brasileira. Só algumas questões ainda não entram na minha cabeça. Ser patriota não é exatamente andar com uma bandeira do Brasil a tiracolo. Meu amor ainda não é ágape, ainda não morreria pelo país. Meu amor parece ser platônico: vislumbro que nalgum dia sejamos livres, independentes - inclusive da grande mídia, ou seja, conseguindo ler, ver e ouvir de tudo sob o crivo da criticidade aliado à raivosidade sadia pois esta não me deixará passivo.

16 agosto 2005

CORTEI OS BRAÇOS

16 agosto 2005 0
Levi Nauter, em 16-08-05
Mais do que nunca a matraca (que tratei no texto "A matraca nossa de cada dia" - ver ícones) tem funcionado. Também nada mais atual que as grandes composições de Chico Buarque. A história tem andado em círculos. A matraca tem corrido solta a dizer que de A a Z ninguém é inocente. Chico continua dizendo "que a coisa aqui tá preta".
Eu decidi "cortar os braços". Não quero ser de direita nem de esquerda. Já achava esse papo um tanto ultrapassado. Agora, acho vergonhoso. Não me interessa o lado. Quero pensar no social, no humano; mas também no conforto de uma bela casa, olhando e curtindo um DVD; na encomenda de livros pela internet. Chega de achar que a tecnologia é retrógrada ou elite. Todos têm de ter acesso a ela. Claro que continuarei apreciando uma boa horta, colher a fruta do pé; não achar que a agricultura familiar salvará o mundo, em que pese ser importante.Também vou querer que todos tenham direito à terra, à iclusão digital, à educação de qualidade, ao emprego com um salário digno (e não precisa ser de R$ 21.000,00 como o de alguns privilegiados) porque sei poupar.
Vou continuar lendo e me emocionando com Paulo Freire. Como ele, vou querer, com toda minha força, preservar e fortalecer as instituições democráticas. Lerei mais de uma vez o Manual do perfeito idiota latino-americano (editora Bertrand Brasil), bem como todas as obras que me parecem úteis. Em todas quero continuar exercendo minha criticidade, minha dúvida impulsionadora da pesquisa e geradora do saber que, com o tempo, torna-se em conhecimento.
Continuarei achando abominável aqueles que dizem uma coisa e fazem outra. Ainda considerarei absurda a atitude dos que têm um discurso democrático e uma prática repressora. Ou dos que ainda interrogam: "você sabe com quem está falando?". Ou daqueles que se sentem no direito de tudo por estarem numa posição momentânea de poder.
Mesmo contra a maioria, discordarei de que "a voz do povo é a voz de Deus" - embora refletirei na importância de ouvi-la. Mas quero um mundo mais justo, mais humano, mais coerente, mais dialético e menos, muito menos, corrupto.
Minha vida vai continuar. Os projetos que tenho não vão parar só porque alguns grandes andam mais pra lá do que pra cá. Ainda vou ouvir muita música de qualidade, essencialmente a brasileira e a instrumental. Também vou ler Garcia Márquez ( Memórias de minhas putas tristes promete...), Saramago, Cony, Galeano, entre outros. Quero desprender-me desse sistema. Aliás, "o sistema esvazia nossa memória, ou enche a nossa memória de lixo", disse Galeano.
Se tudo isso é se de esquerda, sou esquerda. Se de direita, que seja. Cortei meus braços. Agora só possuo a mente e as pernas. Agora vejo, penso e decido o lado para o qual vou andar. Não tenho mais como me agarrar seja em qual lado for. Estou acostumando a desapegar-me.
 
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